O mundo ainda se recuperava da Segunda Guerra Mundial quando a primeira Copa do Mundo realizada no Brasil começou, em 1950. O país havia sido candidato único e somente 12 das pretendidas 15 seleções desembarcaram aqui para a disputa do torneio.
O CENÁRIO
Em 1946, o Congresso da FIFA decidiu realizar a primeira Copa do Mundo do pós-guerra no Brasil. Estava marcada para 1949, mas a reconstrução dos países europeus e a construção inacabada dos estádios pelo Brasil levou a federação a adiar a competição para o ano seguinte. Mas os problemas inerentes ao desafio de sediar uma Copa do Mundo em tal contexto não se resumiam a cimento e argamassa.
A Argentina, alegando desavenças com a CBD (Confederação Brasileira de Desportos), desistiu da disputa. A França, justificando tabela exaustiva com viagens de Porto Alegre à Recife em menos de dois dias, resolveu não vir. Por fim, a Escócia, amargurada por terminar atrás da rival Inglaterra nas Eliminatórias, esnobou o Mundial.
Dificuldades à parte, a população brasileira estava em polvorosa pela Seleção Brasileira na Copa do Mundo. A torcida lotou os estádios em todos os jogos do Brasil (tanto que, no jogo contra a Espanha, uma pessoa morreu e mais de 200 ficaram feridas), sendo também um fator preponderante de intimidação aos adversários.
Com tamanho apego popular, os políticos, muito interessados em se promover às custas do futebol, surgiam a torto e a direito, intrometendo-se em questões técnicas da CBD e da Seleção. O prefeito do Distrito Federal (Rio de Janeiro, à época, era a capital do Brasil), Ângelo Mendes de Morais, chegou a discursar no Maracanã, minutos antes da final: “Cumpri minha promessa, construindo este estádio. Agora, façam o seu dever, ganhando a Copa do Mundo“.
A Seleção Brasileira era favorita. Aos jogadores eram oferecidas posições para serem prefeitos e vereadores, além da enormidade de brindes e presentes que ganhavam, até mesmo carros (que valiam fortunas). Obviamente, também havia pressão…
OS SÃO-PAULINOS
A Copa realizada no Brasil em 1950 contou com a famosa linha média do Tricolor, composta por Ruy, Bauer e Noronha. Bauer saiu consagrado dos escombros daquele certame e sendo apelidado como o Monstro do Maracanã. O atacante Friaça, autor do gol brasileiro na final contra o Uruguai, também era do São Paulo.
Revelado nas divisões menores do clube em meados dos anos 40, o futebol de Bauer atingiu o clímax justamente na Copa do Mundo de 1950 quando, reconhecidamente, o torcedor brasileiro salvou-lhe do rescaldo da competição, imputando-lhe o apelido. Começou no banco de reservas, mas a partir do segundo jogo, contra a Suíça, superou o boicote bairrista e não perdeu mais o lugar em campo.
Com muita moral, participou da conquista do Pan-Americano de 1952 e foi ainda capitão da Seleção na Copa de 1954, .
O polivalente Ruy (jogou tanto pela direita quanto pelo centro da linha média, e ainda como defensor recuado) era figurinha carimbada da Seleção Brasileira nos anos 40 e início dos 50, onde foi campeão sul-americano de 1949. Na Copa de 1950, somente jogou contra a Suíça, no Pacaembu (empate em 2 a 2). No São Paulo foi tetracampeão estadual (1945, 46, 48 e 49), atuando em 273 partidas e marcando seis gols.
Noronha foi um dos craques que tiveram participação importante para que o São Paulo reinasse no estado nos anos 40. Além da técnica refinada e da voz de comando, consagrou-se também com inesquecíveis gols de cabeça. Como Ruy, foi campeão sul-americano pelo Brasil em 1949 e na Copa do Mundo no Brasil só atuou no empate contra a Suíça. Pentacampeão paulista pelo Tricolor (1943, 45, 46, 48 e 49), o jogador marcou 13 gols em 298 jogos.
O único são-paulino natural do estado do Rio de Janeiro na relação foi Friaça. Contratado junto ao Vasco, um ano antes, o atacante sofreu menos com o segregacionismo da Seleção, atuando em quatro dos seis jogos do Brasil na Copa (os dois primeiros e os dois últimos). Só marcou um gol na competição, justamente na final, contra o Uruguai.
No Tricolor, Friaça foi campeão paulista de 1949 e fez 49 gols em 66 partidas disputadas.
A Copa do Mundo de 1950 foi a primeira com camisas numeradas, mas não de modo fixo. Quando jogaram, Bauer foi o nº 4; Ruy, 5; Noronha, 6; e Friaça usou dois números às costas, o 11, nos dois primeiros jogos, e o 7, nos dois últimos.
A CAMPANHA
No grupo 1 da primeira fase, a Seleção Brasileira abriu a Copa do Mundo em um Maracanã ainda não concluído e enfrentou o México no dia 24 de junho. Venceu a partida por 4 a 0 (dois gols de Ademir, um de Jair e um de Baltazar).
Quatro dias depois, o Brasil encarou a seleção da Suíça no Pacaembu. Por pressão da imprensa e da torcida local, Ruy, Bauer e Noronha entraram em campo, ao lado de Friaça. Ainda assim, o time não passou de um empate em 2 a 2 (tentos de Alfredo e Baltazar).
A equipe não voltaria mais a jogar em São Paulo. A CBD justificaria a decisão alegando que financeiramente as partidas no Rio de Janeiro trariam maior retorno. Em verdade, sabe-se que não foi o único motivo que pesou na escolha. O bairrismo era mais forte que o dinheiro.
Correndo risco de ser eliminada na primeira fase, a Seleção voltou a jogar no Maracanã e fez o melhor jogo dela na primeira fase ao vencer a forte Iugoslávia por 2 a 0, no dia 1º de julho. Classificado, o Brasil passou à fase final, jogada em formato de quadrangular, junto de Uruguai, Espanha e Suécia.
Todas as partidas da Seleção Brasileira foram no Maracanã. Os demais jogos, no Pacaembu. Enquanto o Uruguai empatava com a Espanha em 2 a 2, no dia 9 de julho, o Brasil vencia a Suécia pelo maior placar já alcançado pela Seleção em jogos de Copa: 7 a 1 (quatro gols de Ademir, dois de Chico e um de Maneca).
A segunda rodada do quadrangular, no dia 13 de julho começou com Uruguai vencendo a Suécia, de virada, faltando cinco minutos para o fim do encontro. A Celeste saiu vaiada do Pacaembu pois isso significava que o Brasil, que havia acabado de golear a Espanha por 6 a 1 ao som de “Touradas em Madri”, precisaria no mínimo empatar contra a seleção vizinha. Os gols do Brasil frente a Fúria foram de Chico (2), Ademir, Zizinho, Jair e do espanhol Parra, contra.
A DECISÃO
16 de julho: A partida decisiva parou o país. Mais de 200 mil pessoas no Maracanã esperavam ver o Brasil campeão do Mundo. Os preparativos para a festa e o carnaval fora de época foram montados. Jornais estampavam os 11 brasileiros com manchetes garrafais sobre a conquista do título que ainda não havia acontecido. O adversário, a seleção do Uruguai, soube de tudo.
Enquanto isso, em um Pacaembu vazio, com pouco mais de 8 mil pessoas que realmente gostavam muito de futebol, a Suécia venceu a Espanha por 3 a 1. Afinal, do outro lado da ponte aérea, a futura pátria de chuteiras jogava pelo título! E marcou primeiro: 1 a 0, gol de Friaça, aos 2 minutos do segundo tempo.
Parecia tudo certo. Mesmo que o jogo terminasse empatado, a consagração seria nacional. Mas os uruguaios, que durante toda a fase decisiva ficaram hospedados na sede do São Paulo, no Canindé, não desistiam. Nunca desistem. Aos 21 minutos da etapa complementar, Schiaffino empatou a partida.
Silêncio sepulcral no estádio carioca. A torcida brasileira que antes vibrava e se impunha com um barulho esmagador contra os adversários, agora ameaçava o espírito dos jogadores brasileiros com o absoluto e mortal eco do abandono.
O Maracanã inteiro pesava sobre os ombros de cada um dos atletas compatriotas, exceção feita a Bauer. Não fosse por ele, talvez tivessem sido piores aqueles momentos de pressão dos “orientais”.
Mas a Seleção Brasileira não suportou. Ghiggia marcou o segundo gol do Uruguaio ao escapar pela direita do ataque celeste e chutar forte e rasteiro à esquerda do goleiro Barbosa, que ficou para sempre marcado pelo fato. O Uruguai sagrou-se Campeão do Mundo em 1950. O Brasil, vice-campeão.
A COMISSÃO
OS INSCRITOS
FICARAM DE FORA