Estimativas apontam que os torcedores são-paulinos são entre 16
e 18 milhões de pessoas em todo o Brasil. Um público maior que
populações de muitos países. Não é estranho pensar, então, que o
Tricolor tenha muita história contra Seleções Nacionais. Neste
especial de Copa do Mundo selecionamos algumas passagens de jogos
do clube contra países que, hoje, muito possuem em comum com o São
Paulo.
A terceira história que abordamos é de uma partida contra o
Uruguai, seleção que tem como ponto de concentração da torcida
durante a Copa do Mundo de 2014
o restaurante Copa, no Estádio do Morumbi.
ANTES DA BOLA ROLAR
Faltando poucos dias para a Copa do Mundo de 1974, a Seleção do
Uruguai solicitou ao São Paulo a liberação de Forlán e Pedro Rocha
para concentração e amistosos preparativos. Por essa cessão, a
associação uruguaia e o Tricolor combinaram um jogo amistoso
beneficente no Estádio Centenário, em Montevidéu.
O São Paulo vinha embalado, estava invicto há 18 jogos. Não
sabia o que era derrota desde fevereiro, quando perdeu por 1 a 0
para o Cruzeiro, no Mineirão. Havia acabado de vencer o Jorge
Wilstermann, em casa, por 5 a 0, em jogo valendo pela Copa
Libertadores da América, onde liderava o seu grupo – naquela
temporada o São Paulo foi vice-campeão da competição.
A delegação embarcou para o país vizinho no dia 9 de maio. Lá,
ainda teriam tempo para um treinamento físico e para Poy decidir a
escalação. O Tricolor estava desfalcado de Terto, Ademir e
Paranhos, que nem viajaram. Piau estava com os olhos inflamados e
também não era certo que jogasse.
Na capital uruguaia, os dirigentes locais tentaram convencer a
comitiva tricolor a deixar Pedro Rocha e Forlán atuarem pela
Celeste, ou ao menos um tempo de jogo em cada time. Não houve
acordo: jogariam pelo Tricolor, inclusive Forlán, que já havia se
apresentado à seleção, e mesmo entrado em campo contra a
Irlanda.
O ADVERSÁRIO
O Uruguai, cabeça de chave da Copa do Mundo daquele ano por ter
sido semifinalista da competição em 1970, havia vencido a Seleção
da Irlanda, no dia 8 de maio, em casa, por 2 a 0, com dois gols de
Morena. Era a oitava partida preparatória da equipe, mas somente a
primeira de Forlán junto a eles.
Os destaques daquele time uruguaio eram, além de Rocha e Forlán,
o goleiro Mazurkiewicz, do Atlético Mineiro, os meias Cubilla e
Castillo (esses não atuariam no amistoso), além do lateral Pavoni –
que faria o único gol da Celeste na Copa do Mundo daquele ano.
A equipe não era unanimidade no Uruguai (e como os resultados da
Copa viriam a demonstrar, com razão) e também por isso a imprensa
local aprovou a realização do amistoso contra o forte Tricolor,
afirmando que seria o teste ideal e mais difícil de toda a
preparação da Celeste. A expectativa para o jogo foi grande.
Mobilizada, a torcida adversária lotou o Estádio Centenário: 55 mil
pagantes, mais de 70 mil presentes.
O ESPÍRITO
Imagine, caro leitor, a seguinte situação: Você é um jogador
profissional, capitão da equipe. O jogo que se desenrola acontece
no principal estádio de seu país, local que sempre considerou um
verdadeiro templo de fé. Lotado, a torcida em polvorosa. Os times
que se digladiam são muito bem conhecidos por você. Um deles é a
seleção de sua terra natal. O outro, um clube que passou a amar e a
respeitar absolutamente.
Pense que o manto que veste não é o de sua pátria, mas sim o
deste clube, e que com esta camisa, suada por verdadeira garra,
marque o gol da vitória de sua equipe contra a de seus
conterrâneos, calando por breves segundos a todos presentes, até
que uma majestosa salva de palmas rompe gradativamente o silêncio
sagrado.
Agora, amigo, deixe de imaginar. Isso foi real. E ilustra
bem o dom de se vestir uma camisa como se fosse sua pele. Dom dos
uruguaios Pedro Rocha e Pablon Forlán.
(trecho republicado de
Sangue Celeste, Alma Tricolor)
O JOGO
“Emoção desde o início” – Essa foi a chamada da
reportagem do O Estado de São Paulo, de 12 de maio, sobre o jogo
ocorrido no dia anterior, em Montevidéu. Destaca ainda que o jogo
foi “definido como ‘empolgante’ pelos próprios comentaristas
locais“. Foi muito mais que isso.
Logo aos três minutos de bola rolando, Waldir Peres fez uma
defesa espetacular após o chute do lateral Pavoni. O São Paulo se
acertou em campo, porém, e com um toque de bola cadenciado passou a
controlar a partida.
O Tricolor atuava em um ‘4-2-4 clássico’, da época, para tentar
furar o sistema uruguaio que, apesar de fortemente defensivo, não
impedia que ameaçassem a meta do goleiro são-paulino. O primeiro
tempo chegou ao fim sem os zeros deixarem o placar, mas não por
falta de oportunidades dos dois lados.
Pouco após o recomeço do jogo, aos três minutos, o lance
decisivo da partida, o momento épico e inesquecível para quem lá
esteve presente: Pablo Forlán lançou a bola para Pedro Rocha, que
avançou adentro da área da Celeste, cara a cara com o goleiro, e a
desviou sutilmente para o fundo do gol. Gol do São Paulo, gols dos
uruguaios do Tricolor!
Após o minuto de silêncio e a salva de palmas decorrente, o
restante do jogo passou ofuscado. O Uruguai partiu desesperadamente
ao ataque, mas todos foram contidos pela defesa são-paulina,
principalmente pelo goleiro Waldir Peres. Mesmo a expulsão de
Gilberto, ao fim do jogo, não pôs risco ao placar.
No dia seguinte à partida, os jornais uruguaios destacavam o
valor do embate e o desempenho do São Paulo, “digno representante
da escola brasileira”, mas principalmente a atuação de Pedro Rocha,
naquele dia em que o capitão marcou um gol contra a própria
pátria.
SELEÇÃO DO URUGUAI 0 x 1 SÃO PAULO FUTEBOL
CLUBE
Local: Estádio Centenário, em Montevidéu
(Uruguai)
Data: 11/05/1974 (sábado), 16h
Renda: Pesos 50.000.000,00
Público: 55.000 pagantes, +70.000
presentes
Cartão Vermelho: Gilberto Sorriso
SPFC: Waldir Peres; Pablo Forlán (Nelson),
Samuel, Arlindo e Gilberto Sorriso; Chicão e Pedro Rocha; Mauro
Madureira, Mirandinha, Zé Carlos e Piau
(Teodoro). Técnico: José Poy.
Gol: Pedro Rocha, 3min/2ºT
Uruguai: Hector Santos, Mario Gonzalez, De
Simone, Masnik, Pavoni, Cardaccio (Rivero), Gomes, Jimenez, Morena,
Mantegazza, Corbo
(Millar). Técnico: Roberto Portada.