Campeão Paulista de 1957

Campeão Paulista de 1957

Calendário 29/12/2024 - 05:00

No dia 29 de dezembro de 1957, o São Paulo venceu o Corinthians por 3 a 1 no Pacaembu, com gols de Amaury, Canhoteiro e Maurinho, em ocasião que ficou para a história como “a tarde das garrafadas”, e sagrou-se campeão paulista de 1957: o oitavo título estadual do clube.

AS PUBLICAÇÕES HISTÓRICAS

Após os cinco campeonatos estaduais conquistados no Pacaembu entre os anos de 1943 e 1949, o Tricolor foi campeão do Paulistão de 1953, na Vila Belmiro (com um 3 a 1 sobre o Santos), às vésperas do quarto centenário da Cidade de São Paulo, no dia 24 de janeiro de 1954. Os paulistanos passaram o aniversário do município a festejar mais uma glória são-paulina. O Municipal, contudo, só voltou a ver o São Paulo campeão novamente – e pela última vez – em 1957, já com as obras do Morumbis, a pleno andamento.

O Pacaembu em um Choque-Rei, nos anos 40 – A Gazeta Esportiva

O Tricolor, depois da infelicidade ocorrida no estadual do ano anterior, onde o time terminou com o vice-campeonato em jogo extra (havia terminado a fase regular empatado com o Santos na primeira posição, tendo perdido apenas uma partida até ali), viu o Campeonato Paulista de 1957 iniciar-se com outro rival disparando na liderança: o Corinthians.

Tudo bem que, como em 1956, o torneio naquela oportunidade tinha um regulamento alternativo, em que a primeira fase não valia muita coisa (eram 20 clubes e o estágio inicial, de turno único, classificava os 10 primeiros para a competição propriamente dita, de dois turnos). Nesse primeiro momento, o Tricolor não foi bem: perdeu logo na estreia para o Botafogo de Ribeirão Preto e até o fim dessa classificatória acumulou derrotas para o Juventus, XV de Piracicaba e Corinthians.

Justamente esse rival terminou a fase inicial arrebatador, com 13 vitórias em 19 jogos, sem nenhuma derrota. O Tricolor passou na quinta colocação (empatado em pontos com o Jabaquara, mas com uma vitória a menos). O elenco são-paulino, comandado pelo revolucionário técnico húngaro, Béla Guttmann, era bom. Mas havia algo, alguma engrenagem a ser completada…

O técnico Béla Guttmann, ao centro – Arquivo Histórico João Farah

A peça que faltava foi encontrada na figura de Zizinho, veterano craque do Bangu (à época, considerado o terceiro melhor jogador de futebol do Brasil em todos os tempos, somente atrás de Friedenreich e Leônidas, também tricolores), contratado pelo clube com o primeiro turno da fase final já em disputa.

O novo camisa dez estreou no torneio em 10 de novembro, contra o Palmeiras, e o resultado foi imediato: 4 a 2 para o São Paulo. Nos primeiros cinco jogos com ele em campo, o Tricolor não marcou menos de quatro gols por partida (completam a lista um 7 a 1 no XV de Novembro, um 6 a 2 no Santos, um 6 a 2 na Ponte Preta e um 5 a 3 novamente no time de Piracicaba).

Em verdade, com o Mestre Ziza, o São Paulo não voltou a perder no campeonato (foram 10 vitórias e dois empates, até o final). O ataque, formado por Maurinho, Amaury, Gino Orlando, Zizinho e Canhoteiro tornou-se opressor e, aliado ao já forte sistema defensivo de Poy, De Sordi, Mauro e Dino Sani (todos selecionáveis), tornou o Tricolor sério candidato ao título.

O craque Zizinho, que chegou em boa hora – Arquivo Histórico João Farah

O problema é que o Corinthians ainda estava disparado na ponta da tabela, e invicto. Para acirrar ainda mais a rivalidade entre as duas equipes, no jogo do primeiro turno da fase final (antes da chegada de Zizinho), terminado empatado em 1 a 1, Alfredo Ramos, ex são-paulino, acabou fraturando a perna em uma dividida com Maurinho. O fim daquele jogo foi de nervos a flor da pele, principalmente para o atacante Gino Orlando e para o corintiano Luisinho, que se estranhavam a todo momento.

No dia seguinte, Gino e outros tricolores foram visitar o antigo companheiro de clube, que estava internado no hospital. Após o encontro, Luisinho, que também fora visitar o colega, mas que resolvera se esconder atrás de uma árvore após ver os são-paulinos, atirou um tijolo à cabeça do centroavante do Tricolor, e fugiu!

Maurinho, Gino Orlando e Zizinho, um trio espetacular – Arquivo Histórico João Farah

Como seria o encontro deles, em um Pacaembu lotado, na última rodada do Campeonato? Agravado pelo fato de que, nesta “final”, dia 29 de dezembro, o Tricolor já havia conseguido igualar a situação de pontos na tabela. Uma semana antes, na Vila Belmiro, o Santos venceu o Corinthians e pôs fim a uma série de 35 jogos sem perder do time de Parque São Jorge, enquanto o São Paulo bateu o Palmeiras, por 1 a 0.

Quem vencesse seria o campeão; se empatassem, os dois times se juntariam ao Santos (que brevemente ficou na dianteira da pontuação, por um ponto, ao vencer a última partida dele um dia antes) e disputariam um triangular decisivo, então denominado “supercampeonato”.

Cena rara: sorteio de árbitro minutos antes do jogo / Arquivo Histórico João Farah

Como havia toda uma carga extra de polêmica e rivalidade posta em campo na partida decisiva, a Federação Paulista ousou e resolveu investir na melhor arbitragem que poderia adquirir. Pagou a quantia mais alta da história do futebol sul-americano até então pelo trio Malcher, Cross e Lynch – estes últimos, britânicos, que apitavam na Argentina. O juiz da partida somente seria escolhido momentos antes de começar a peleja, através de sorteio (os outros dois, tornar-se-iam bandeirinhas do jogo).

No aspecto técnico, o Tricolor talvez estivesse um pouco atrás do oponente na hora H, pois o importantíssimo Dino Sani se contundira e, para piorar, o suplente dele, Ademar, também havia se machucado. Só restava Sarará, que não jogara uma partida sequer no certame até então, para substituí-lo. Detalhe: Sarará estava afastado do elenco por desentendimentos com Béla Guttmann e teve que ser reincorporado nos últimos momentos…

Foguetório na entrada dos tricolores ao campo / Arquivo Histórico João Farah

Com a bola rolando, não deu nem cinco minutos de jogo e o primeiro “arranca-rabo” veio para por à prova o trio de arbitragem do jogo: Gino e Luisinho deixaram os seus recados um na perna do outro, em uma dividida.

Toda forma, talvez por haver menos pressão sobre os são-paulinos, levemente azarões, o Tricolor logo tomou conta do jogo e, assim, aos 17 minutos, forçou a queda do primeiro zero do placar: 1 a 0 com Amaury, que recebeu passe de Gino, avançou pela ponta esquerda e bateu sem chances para o goleiro adversário, encobrindo-o. Uma maestria!

O gol de cobertura de Amaury – Folha da Manhã e Revista Placar nº 264, de 1975

Desnorteado, o Corinthians tentou ir ao ataque com tudo e por fim a desvantagem. Aberto, foi pego no contra-ataque um minuto depois do primeiro tento são-paulino. Amaury lançou Canhoteiro, que sozinho na ponta esquerda se desvencilhou do marcador, deixando-o sentado no chão, e chutou no canto direito do arqueiro corintiano, que pensava vir dali um cruzamento: 2 a 0!

Contudo, a pressão do rival se manteve e, aos 21 minutos, rompeu o cerco tricolor: 2 a 1. O cenário do jogo não se alterou até o final da primeira etapa, com a defesa são-paulina se sustentando firmemente. O segundo tempo foi na mesma toada, sem que, entretanto, aqueles em desvantagem tivesse qualquer chance real de ameaçar o São Paulo, que se defendia, ora com classe, ora como podia, por vezes dando balões para o alto mesmo, pois era jogo de campeonato.

Cenas do jogo – A Gazeta Esportiva

Em um desses bicos pra cima, aos 34 minutos, Zizinho recebeu e dominou a pelota caída dos céus, passou para Gino, que de primeira repassou para Maurinho, mais ao fundo. Muitos ali, depois, reclamaram impedimento, mas o bandeirinha Lynch nada marcou (e toda a imprensa assim aprovou) e a jogada seguiu. O ponta-direita são-paulino ganhou na corrida de Olavo e chegou cara à cara com o goleiro Gilmar.

Depois de dribá-lo, Maurinho parou e esperou o guarda-meta rival. Diz a lenda que, naquele momento, o atacante do Tricolor indagou ao oponente em que canto gostaria que chutasse a bola. Isso mesmo: “Em que canto você quer?”.

O terceiro gol do Tricolor, de Maurinho – Revista Placar nº 264, de 1975

Sem chance alguma para defesa. Gol do São Paulo! O terceiro do jogo, o que liquidava a partida. Na comemoração, Maurinho deu um tapinha no queixo de Gilmar, apontou e proferiu “Pega lá”. Foi a deixa para a maior confusão já vista no Pacaembu até os tristes eventos ocorridos na Supercopa São Paulo de Juniores, de 1995.

Socorro a um ferido por garrafa e prisão de meliante que invadiu o campo – A Gazeta Esportiva

Os corintianos paralisaram a partida por cinco ou seis minutos, reclamando da decisão do árbitro. O zagueiro Olavo chegou a agredir fisicamente o bandeirinha Lynch, mas nem expulso foi. Depois do ataque, os torcedores do Parque São Jorge começaram a atirar paus, pedras e principalmente garrafas em direção ao assistente britânico – sério, uma chuva de garrafas -, o que forçou o árbitro Malcher a solicitar a troca dos auxiliares para que a partida tivesse reinício.

Houve, ainda, necessidade de intervenção policial para acalmar os ânimos dos torcedores invadiram o campo e que digladiavam entre si nas gerais do Pacaembu.

A torcida corintiana não soube se comportar, enquanto a são-paulina só fez festa – A Gazeta Esportiva

Sem muito tempo para que acontecesse algo mais durante o jogo, logo o São Paulo sagrou-se Campeão Paulista de 1957. Quanto ao Corinthians, que até duas rodadas antes estava invicto, não restou nem o vice-campeonato, obtido pelo Santos. O técnico Brandão foi demitido e o maior artilheiro da história dos rivais, Cláudio, se aposentou. Trindade, presidente do time terceiro colocado, também não se reelegeu. Uma pequena crise plantada pelo Tricolor…

Quanto ao craque Maurinho, quando questionado pelos repórteres (lembrando que houve transmissão também pela televisão) sobre o lance capital da partida, o atacante afirmou que o goleiro Gilmar dizia para o companheiro Oreco o seguinte: “Oreco, dentro da área não, pois seria pênalti, mas fora da área pode dar pra quebrar as duas pernas deles, que cobrança de falta eu garanto”.

A resposta que o ponta-direita do Tricolor encontrou para essas palavras foi a bola do título dentro das redes adversárias.

O JOGO DO TÍTULO

29.12.1957
São Paulo (SP)
Estádio Municipal de São Paulo (Pacaembu)

Raro ingresso da decisão. Doação de Paulo Alvarenga Isidoro / Arquivo Histórico João Farah

SÃO PAULO Futebol Clube 3 X 1 Sport Club CORINTHIANS Paulista

SPFC: José Poy; De Sordi e Mauro; Sarará, Victor e Riberto; Maurinho, Amaury, Gino Orlando, Zizinho e Canhoteiro. Técnico: Béla Guttman.
Gols: Amaury, 17′/2; Canhoteiro, 19′/2; Maurinho, 34′/2.

SCCP: Gilmar; Olavo e Oreco; Idário, Valmir e Benedito; Cláudio, Luizinho, Índio, Rafael e Zague. Técnico: Oswaldo Brandão.
Gol: Rafael, 21′/2 .

Árbitro: Alberto da Gama Malcher
Renda: Cr$ 2.409.040,00
Público: 39.670 pagantes

De Sordi, Poy, Sarará, Riberto, Victor, Mauro e Serrone (roupeiro); Maurinho, Amaury, Gino Orlando, Zizinho e Canhoteiro

A CAMPANHA

Fase Preliminar
14.07.1957 – 1 X 2 – BOTAFOGO Futebol Clube (Ribeirão Preto – SP)
19.07.1957 – 7 X 0 – Clube Atlético LINENSE (SP)
24.07.1957 – 4 X 2 – Esporte Clube TAUBATÉ (SP)
28.07.1957 – 4 X 1 – Esporte Clube NOROESTE (SP)
01.08.1957 – 1 X 1 – Esporte Clube XV de Novembro (Jaú – SP)
04.08.1957 – 0 X 0 – Sociedade Esportiva PALMEIRAS (SP)
07.08.1957 – 0 X 0 – NACIONAL Atlético Clube (SP)
11.08.1957 – 2 X 0 – JABAQUARA Atlético Clube (SP)
15.08.1957 – 1 X 1 – Associação FERROVIÁRIA de Esportes (SP)
18.08.1957 – 1 X 2 – Clube Atlético JUVENTUS (SP)
25.08.1957 – 1 X 2 – Sport Club CORINTHIANS Paulista (SP)
28.08.1957 – 4 X 2 – GUARANI Futebol Clube (SP)
31.08.1957 – 2 X 1 – Associação Atlética PORTUGUESA (Santos – SP)
05.09.1957 – 1 X 2 – Esporte Clube XV de Novembro (Piracicaba – SP)
09.09.1957 – 2 X 2 – Associação PORTUGUESA de Desportos (SP)
12.09.1957 – 3 X 0 – Clube Atlético YPIRANGA (SP)
15.09.1957 – 3 X 2 – SANTOS Futebol Clube (SP)
22.09.1957 – 5 X 0 – Associação Atlética SÃO BENTO (São Caetano do Sul – SP)
29.09.1957 – 5 X 0 – Associação Atlética PONTE PRETA (SP)

Fase Única – Turno
09.10.1957 – 1 X 1 – BOTAFOGO Futebol Clube (Ribeirão Preto – SP)
13.10.1957 – 2 X 0 – JABAQUARA Atlético Clube (SP)
16.10.1957 – 5 X 1 – Associação Atlética PORTUGUESA (Santos – SP)
20.10.1957 – 1 X 1 – Sport Club CORINTHIANS Paulista (SP)
28.10.1957 – 0 X 4 – Associação PORTUGUESA de Desportos (SP)
03.11.1957 – 2 X 0 – Associação Atlética PONTE PRETA (SP)
10.11.1957 – 4 X 2 – Sociedade Esportiva PALMEIRAS (SP)
13.11.1957 – 7 X 1 – Esporte Clube XV de Novembro (Piracicaba – SP)
17.11.1957 – 6 X 2 – SANTOS Futebol Clube (SP)

Fase Única – Returno
20.11.1957 – 6 X 2 – Associação Atlética PONTE PRETA (SP)
24.11.1957 – 5 X 3 – Esporte Clube XV de Novembro (Piracicaba – SP)
01.12.1957 – 2 X 1 – JABAQUARA Atlético Clube (SP)
03.12.1957 – 2 X 2 – SANTOS Futebol Clube (SP)
08.12.1957 – 0 X 0 – BOTAFOGO Futebol Clube (Ribeirão Preto – SP)
15.12.1957 – 3 X 2 – Associação Atlética PORTUGUESA (Santos – SP)
19.12.1957 – 3 X 1 – Associação PORTUGUESA de Desportos (SP)
22.12.1957 – 1 X 0 – Sociedade Esportiva PALMEIRAS (SP)
29.12.1957 – 3 X 1 – Sport Club CORINTHIANS Paulista (SP)

OS CAMPEÕES

NOMEJVEDGMGS
Ademar (VL)951300
Amaury (AT)221651140
Antônio Rosa (MC)944100
Attílio (DF)210100
Baltasar (AT)632120
Bizon (DF)110000
Canhoteiro (AT)352195120
Celso (AT)1164120
Clélio (DF)1063100
De Sordi (LD)31198400
Dino Sani (VL)291964100
Gino Orlando (AT)272052190
Jose Poy (GL)241851030
Maneca (MC)200200
Maurinho (AT)311984150
Mauro (DF)30197400
Ney Blanco (AT)211065140
Paulo (GL)842207
Riberto (LE)35228520
Rubine (AT)220010
Sarará (MC)110000
Silva (AT)303000
Silvio (AT)430100
Víctor (DF)37239500
Waldemar (GL)512207
Zizinho (MC)12102060

A CLASSIFICAÇÃO FINAL

TimePGJGVEDGMGSSG
1São Paulo FC55372395994356
2Santos FC563726471446579
3SC Corinthians P603725102903951
4A Portuguesa D473718118755124
5Botafogo FC (RP)41381691356551
6AA Portuguesa (Santos)37371311135662-6
7AA Ponte Preta3637164175973-14
8Jabaquara AC3537139155467-13
9SE Palmeiras323711101666597
10EC XV de Novembro (P)3037142217096-26
11EC Noroeste443818812786018
12EC Taubaté383717416705911
13AA São Bento (SCS)38371410134956-7
14CA Juventus3537155176568-3
15A Ferroviária E3437146176075-15
16Nacional AC3437146176278-16
17Guarani FC333714518918110
18EC XV de Novembro (J)243796225589-34
19CA Ypiranga203776243782-45
20CA Linense1337372729107-78

Por Michael Serra / Arquivo Histórico João Farah

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