A conquista do Campeonato Paulista de 1970

A conquista do Campeonato Paulista de 1970

Calendário 9/09/2021 - 08:29
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Por muito tempo, para o são-paulino, o anseio de ter a própria casa foi mais importante do que qualquer título. Se fazia o possível primeiro, e o impossível depois. Isso trouxe dor, mas fortes se tornaram aqueles que a suportaram. Com o Estádio do Morumbi pronto a diretoria tricolor tratou de por fim à incomoda seca, que perdurava desde o título paulista de 1957.

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Ainda em 1969, Gérson, o Canhotinha de Ouro, foi contratado junto ao Botafogo. No mesmo ano, o artilheiro dos últimos dois Campeonatos Paulistas, Toninho Guerreiro, também chegou ao Tricolor vindo do Santos, depois de desavenças com o clube do litoral referentes a acordos financeiros. Mas ainda era pouco, e o que o São Paulo almejava não o era. 

Era preciso ser campeão. Viriam, então, ao longo de 1970, dois nomes de nível internacional, de seleção semifinalista da Copa do Mundo, dois ídolos de primeiro patamar: Pablo Forlán e Pedro Rocha, contratados do Peñarol, do Uruguai. O primeiro, por 120 mil dólares, e o segundo, por 150 mil. 

Pedro Rocha, a maior contratação, contudo, não disputaria uma partida sequer do Campeonato Paulista que marcaria o fim do sofrimento são-paulino. A negociação do jogador junto ao time uruguaio e ao empresário Juan Figger foi longa e complexa, e o craque só foi contratado pelo Tricolor para a disputa do Torneio Roberto Gomes Pedrosa após o estadual.

 

INÍCIO COM VITÓRIA E VAIAS

O Campeonato Paulista de 1970 foi de tiro curto, ao menos para os clubes grandes. Na primeira fase, chamada de Paulistinha, onze times se enfrentaram em turno e returno, e após um triangular para desempate de posições, cinco times se classificaram para a fase final, denominada Paulistão. Assim, Guarani, Ferroviária, Botafogo, São Bento e Ponte Preta se juntaram a São Paulo, Santos, Palmeiras, Corinthians e Portuguesa.

Esses dez clubes se enfrentaram em turno e returno no sistema de pontos corridos. Um regulamento simples e prático, sem campeões de turno, mata-matas ou nada do tipo. O torneio se iniciou logo após a disputa da Copa do Mundo do México. Em meio a um cenário de euforia pela conquista do tricampeonato mundial pela Seleção Brasileira, o Tricolor começou a jornada pelo fim de seu calvário justamente na sua casa recém-concluída. Mas os tricolores não estavam nem um pouco confiantes no time. 

O São Paulo estava “iniciando a disputa de outro campeonato paulista do mesmo modo como o tem feito nos últimos dez anos: desacreditado pela própria torcida, sem muitas chances de chegar ao título”, como afirmou o jornal O Estado de S. Paulo de 28 de junho de 1970.

Foi nesse dia que o São Paulo inaugurou sua casa totalmente nova e completa em partidas do Paulistão vencendo o São Bento por 1 a 0, mais uma vez com gol de Miruca, aos 13 minutos do primeiro tempo. 

Gérson não jogou, ainda estava de férias pelo feito com a Seleção. Zezé Moreira escalara o time com Picasso no gol; Pablo Forlán, Jurandir, Roberto Dias e Tenente na defesa; Édson Cegonha e Nenê no meio de campo; Miruca (depois Paulo Nani), Terto, Toninho Guerreiro (recuperado de uma contusão sofrida contra o Red Star, em amistoso realizado na França) e Paraná no ataque.

Apesar da vitória, o time são-paulino foi muito vaiado pela torcida nos quinze minutos finais de jogo, momentos em que Picasso era o grande destaque da partida, impedindo o empate do time adversário. 

Mesmo com um prometido “bicho” de 500 cruzeiros pela vitória, o São Paulo perdeu a primeira partida no campeonato já na segunda rodada, contra a Portuguesa, no Parque Antártica, no dia 1 de julho. O gol de Roberto Dias, de pênalti, empatando o jogo no começo do segundo tempo, não bastou: a Lusa fez mais um e venceu por 2 a 1, apesar da pressão são-paulina no fim do confronto.

Cabe pontuar a boa atuação de Forlán, que abusou da velocidade pelo setor direito do campo. Já a culpa pelo resultado caiu, claro, no colo do técnico Zezé, que adotou o 4-3-3 na partida, mantendo Nenê e Lourival (escalado no lugar de Miruca) no meio de campo, ao invés do esperado 4-2-4, com um desses dois atletas mais à frente. 

No terceiro embate, que marcou as estreias do grande goleiro Sérgio Valentim e do incansável Gilberto Sorriso, se não é possível chamar de tropeço, em vista o bom time adversário, também não dá para dizer que foi um bom resultado: 2 a 2 contra a Ponte Preta, no dia 5 de julho, no Moisés Lucarelli. 

Terto abrira o placar para o Tricolor, no primeiro tempo, mas a Ponte empatou com pouco tempo de jogo na segunda etapa. Toninho Guerreiro, então, colocou o São Paulo de novo em vantagem, aos 27 minutos, mas, para surpresa dele, o atacante foi substituído por Everaldo com pouco mais de dez minutos para o fim do jogo. Contrariado pela substituição, Toninho viu, do lado de fora do campo, a Ponte Preta empatar a partida aos 40 minutos, com Manfrini.

Após o jogo, Toninho não se conteve, dizendo que não aceitaria humilhações, pois ele, um atacante com mais de 800 gols na carreira (nas contas do atleta), não era nenhum perna de pau e que, com ele durante os 90 minutos, o São Paulo não teria se descontrolado e voltaria de Campinas com a vitória. O clima estava quente, mas nem tanto para Zezé Moreira, que preferiu não dar corda no assunto. 

 

O CANHOTINHA DE OURO 

O time só emplacou mesmo a partir do retorno de Gérson aos gramados. Com seu merecido descanso concluído (e apesar dos comentários desnecessários ditos ainda no Rio de Janeiro de que gostaria de encerrar a carreira no Fluminense, mas que cumpriria o contrato com o São Paulo), o camisa 10 são-paulino começaria a fazer a diferença.

E nada melhor que começar essa campanha com um acirrado confronto. Santos versus São Paulo, Pelé x Gersón – o primeiro após a conquista do Tri Mundial de 1970. 

Não deu para Pelé. “Com lançamentos perfeitos, boa cobertura à defesa e comandando a equipe”, o Canhotinha levou o São Paulo à vitória contra o Santos por 3 a 2, no dia 12 de julho, no Parque Antártica (os santistas decidiram mandar o jogo na capital paulista, mas em campo neutro). Carlos Alberto Torres, marcando contra, Miruca e Édson Cegonha, de cabeça, foram os autores dos gols. 

O esquema tático de Zezé Moreira, em especial no setor do meio de campo, antes muito criticado, caiu perfeitamente bem quando desempenhado por Gérson. O ídolo tinha tanta moral com a cúpula são-paulina que a diretoria, poucos dias depois, ofereceu a ele e à esposa um banquete, uma homenagem oficial pela conquista com a Seleção Brasileira.

Mas voltando ao relvado… A essa altura, o time ocupava a terceira posição na tabela, junto a Guarani e Corinthians, com cinco pontos, e atrás da Ponte Preta, que tinha seis pontos, e da Portuguesa, de sete pontos, mas que também tinha uma partida a mais já realizada.

No dia 16 de julho, quinta-feira, o São Paulo retornou mais uma vez ao Parque Antártica, agora como mandante, em confronto contra a Ferroviária. O Pacaembu passava por reformas e, como o jogo seria à noite – o sistema de iluminação do Morumbi só ficaria pronto em 1971 –, a solução encontrada foi a utilização do estádio palmeirense para a realização do jogo.

Apesar de Zezé Moreira reconhecer abertamente que não conhecida nada do time araraquarense antes do começo da partida, o São Paulo venceu a Ferroviária por 2 a 1, com dois gols de Toninho Guerreiro no segundo tempo. Com a vitória, a liderança na tabela foi alcançada em um empate tríplice com a Lusa e o Guarani (este último, com uma partida a mais realizada). Tudo aparentemente muito bom, mas Gérson sentira uma antiga contusão, uma distensão muscular na coxa direita e passou a ser dúvida para o embate seguinte, justamente um clássico.

O primeiro Majestoso da nova era do Morumbi foi disputado no dia 19 de julho sob os olhares de 45.063 pagantes no estádio, torcedores estes que estavam esperançosos em ver um grande duelo entre Gérson e Rivellino, mas ambos não estavam nas melhores condições físicas. 

O Canhotinha teve que ser, inclusive, substituído por Nenê, aos 33 minutos da etapa final.

Depois de sair na frente, com um gol de Toninho Guerreiro aos nove minutos do primeiro tempo, o Corinthians, treinado pelo ilustre Dino Sani, empatou o jogo com um tento de Lima, de falta, aos oito minutos da etapa final. E o jogo acabou assim, no 1 a 1. 

O ponto polêmico da partida foi justamente o gol de empate corintiano. Pouquíssimas pessoas no Morumbi teriam visto a bola, chutada fortemente por Lima, ultrapassar a linha final da meta tricolor. Ainda assim, o bandeirinha Renato Oliveira Braga e o árbitro Aldo Aníbal Oviedo validaram o gol, comprovado por fotos de veículos de imprensa.

Com a vitória da Ponte Preta sobre a Portuguesa, por 2 a 1, e do Santos sobre o Guarani, por 5 a 2, naquela rodada, o Tricolor se manteve na liderança do torneio, mas empatado justamente com a Ponte, que tinha um jogo a menos, e o Santos, todos com oito pontos ganhos.

Sem Gérson, sob tratamento com o médico Dalzell Freire Gaspar, o Tricolor viajou para Ribeirão Preto, no dia 26 de julho, onde enfrentou o lanterna do Paulistão, o Botafogo local, no sempre complicado de encarar Estádio Santa Cruz. O time, porém, se saiu bem e venceu por 2 a 1, ambos os gols marcados no primeiro tempo. O primeiro, por Édson Cegonha, depois de cobrança de escanteio e rebatida da zaga, e o segundo por Terto, no rebote de uma cobrança de falta de Dias que acertou a trave.

Nesse momento, o campeonato ainda estava muito embolado. A Ponte tirou seu jogo atrasado, venceu a Ferroviária e, ao empatar com o Palmeiras em 0 a 0, assumiu a liderança isolada do Paulistão, com 11 pontos. São Paulo, Santos e Corinthians seguiam na cola do time campineiro, com dez pontos.

 

CHOQUE-REI DESFALCADO

Na volta do interior, o São Paulo teve mais um clássico pela frente no dia 29 de julho: Choque-Rei na casa do rival. O Tricolor agora estava tinindo e com o time titular completo, com o Canhotinha liberado pelo Departamento Médico: Sérgio; Forlán, Jurandir, Roberto Dias e Gilberto Sorriso; Édson Cegonha e Gérson; Paulo Nani, Terto, Toninho Guerreiro e Paraná. 

Apesar do domínio são-paulino, que desperdiçou várias oportunidades de gol, a partida se manteve truncada na maior parte do tempo, e a vitória só se caracterizou no terço final da segunda etapa, com o gol de Terto, marcado aos 33 minutos, que furou o sistema defensivo montado pelo técnico Rubens Minelli. Os palmeirenses muito reclamaram do gol, validado pelo árbitro Armando Marques, alegando toque de mão do atacante são-paulino no lance em que, com o peito, ele encobrira o goleiro Leão.

Sem levar em conta as lamúrias do rival, a imprensa especializada foi categórica em afirmar que o resultado foi justo para com o melhor desempenho são-paulino em campo, que chamou a atenção também pela mobilidade tática pregada por Zezé.

O time, durante os 90 minutos, variou constantemente do 4-3-3 para o 4-4-2 ou até o 4-2-4, graças aos incansáveis Paulo e Toninho, que se revezavam nas funções correspondentemente necessárias para cada sistema.

Alguns dias depois, Zezé falaria aos repórteres que, no time dele, só quatro jogadores tinham posição fixa, sendo um deles o goleiro (também o lateral-direito, um dos volantes e o ponta Terto). Todos os demais tinham liberdade, ao menos teórica, de mudar de posicionamento e ajudar os companheiros em outras funções. O que seria praticamente um carrossel, quatro anos antes daquele famoso, o holandês. Ainda que, na prática, o time dependesse, quase exclusivamente, do talento de Gérson para encontrar as melhores chances de gol.

De toda forma, a vitória no clássico valeu ao Tricolor a primeira posição no campeonato, com 12 pontos, ainda que dividindo o posto com a Ponte Preta, que ficou no empate sem gols com o Botafogo de Ribeirão em Campinas. 

De volta ao Morumbi, no dia 1º de agosto, o São Paulo tropeçou no Guarani comandado pelo antigo e respeitoso ídolo Armando Renganeschi. Não foi o suficiente para cair e perder, mas o empate em 0 a 0 prejudicou o time na corrida pela liderança com a Ponte Preta que, no dia seguinte, venceu o São Bento no Moisés Lucarelli por 1 a 0 e reassumiu o primeiro lugar na tabela de classificação, com 14 pontos, contra 13 do Tricolor.

O crucial, referente a esse jogo, foi o desempenho são-paulino, muito abaixo do esperado. Não na produção ofensiva – o time produziu boas chances –, mas pelo pífio aproveitamento nos arremates ao gol. A partida foi considerada tão ruim que, mesmo brigando pela ponta da tabela, vaias ecoaram pelas arquibancadas do Estádio Cícero Pompeu de Toledo, ao final do jogo.

 

CORRIDA PELA LIDERANÇA

Ao término do primeiro turno do Campeonato Paulista, a luta pelo título estava parelha entre a Ponte e o Tricolor, mas também com Santos e Corinthians na cola dos dois primeiros, com 11 pontos. A classificação apontava, ainda, Ferroviária, com 10 pontos; Palmeiras, nove; Portuguesa e Guarani, oito; São Bento, cinco, e o Botafogo de Ribeirão na lanterna, com apenas um ponto.

Para o Tricolor, o returno começou com casa cheia no dia 9 de agosto. No Morumbi, com 53.288 pagantes, os são-paulinos viram o Santos sair na frente do placar com Douglas, aos 30 do primeiro tempo. Foi um começo abaixo do esperado para o time da casa, que viu, negado pelo árbitro, um pênalti cometido pelo goleiro Joel em Terto. Perto do fim da primeira etapa, aos 41, porém, Toninho Guerreiro disputou com Pelé e, com uma bela bicicleta, empatou, 1 a 1. 

Grande nome naquele jogo, Toninho virou a partida na segunda etapa, aos 25, depois do encontrão do volante Edson com o goleiro Joel. Doze minutos depois, Terto ampliou para o São Paulo, no contra-ataque, por meio de um excepcional lançamento de Gérson: 3 a 1. O Santos ainda diminuiu a vantagem já no finzinho da partida, novamente com Douglas, mas ficou por isso. 

Ótimo resultado para os são-paulinos, que viram a Ponte Preta acumular pontos (e uma partida a mais) ao vencer o São Bento, em Sorocaba e empatar com o Palmeiras, em Campinas. A briga pela liderança estava, ali, 17 a 15 para os pontepretanos. Apesar disso, Pelé apontava, para a imprensa, que o Tricolor seria o provável campeão da temporada. Ou enfim, talvez só tentasse justificar a derrota.

Contudo, a disputa pelo título poderia ter em muito se complicado para o Tricolor na rodada dos dias 15 e 16 de agosto. Desfalcado do lateral Jurandir, contundido (e com Eduardo no lugar dele), o São Paulo foi a Araraquara enfrentar a Ferroviária e voltou de lá surpreendido com uma derrota por 2 a 0. O primeiro gol adversário, inclusive, contou com uma infelicidade tremenda do arqueiro Sérgio, absolutamente seguro em quase toda a campanha do time, mas que, enganado pelo quique no gramado, aceitou a bola a passar pelo meio das pernas naquele momento.  

Detalhe: a Ferrinha havia sido goleada pelo Santos, por 5 a 0, dias antes… Sorte que o mesmo Santos também tirou os dois pontos da Ponte Preta, vencendo por 1 a 0 em Campinas. 

Bom, sorte mesmo? Com esses placares, agora era o Santos (13 jogos) que dividia a liderança da tabela com a Ponte Preta (12 jogos), com 17 pontos cada. E para complicar mais, o Palmeiras (13 jogos) alcançara o Tricolor, com 15 pontos, e até a Ferroviária (13 jogos) e o Corinthians (12 jogos) ameaçavam o posto são-paulino, com 14 pontos, ambos. A esperança são-paulina residia em ter uma ou duas partidas a menos em relação aos adversários. Mas partida a menos era aquilo: ainda era preciso vencê-las para significar algo positivo.

Não havia muito tempo para respirar e recuperar as forças. Ainda mais com a FPF marcando o próximo jogo para o meio da semana, enquanto o clube esperava que fosse agendada para o sábado ou domingo. 

Na tarde da quarta-feira, 19 de agosto, o São Paulo recebeu a Portuguesa no Morumbi e, apesar das retrancas de ambos os lados, venceu por 1 a 0, gol acidental de Pablo Forlán no comecinho do jogo. O lateral, da quina da grande área, tentou cruzar, mas a bola acabou foi encobrindo o goleiro Orlando, golaço.  

O Tricolor, dessa forma, fez sua parte, e Santos e Ponte Preta apenas empataram em atuações fora de casa contra Botafogo e Guarani. Ainda assim, seguiram na liderança por um ponto de vantagem em relação a São Paulo e Palmeiras, que vencera a Ferroviária.

 

REVÉS NO CLÁSSICO: SERIA O FIM?

O São Paulo poderia selar seu destino de vez no Choque-Rei do dia 23 de agosto. E o mesmo poderia ser dito sobre o rival, na mesma partida. Ambos poderiam ir ao céu, ou ao inferno, dependendo do resultado da peleja, ou da forma de ler a tabela de classificação: por pontos ganhos (empatados), ou por pontos perdidos (Tricolor à frente).

Contra o adversário direto, o Tricolor atuou praticamente completo, desfalcado apenas do lateral-esquerdo Gilberto Sorriso, que sofria com dores nas costas. Tenente jogou no lugar dele. 

Mesmo assim, e apesar de ter controlado a maior parte do jogo e dominado o adversário, o São Paulo não conseguiu penetrar a defesa palmeirense, com o oponente inteiramente recuado desde o gol de Dudu, aos 5 minutos do primeiro tempo. 

Para piorar, a arbitragem prejudicou o Tricolor ao negar-lhe um pênalti cometido por Baldocchi em Paraná, na metade da segunda etapa. Fim de jogo, vitória do time de Rubens Minelli por 1 a 0.

Duas derrotas em três jogos… Teria acabado o sonho do título? O sonho de voltar a ser campeão, após quase 13 anos de duros insucessos? O torcedor são-paulino teria que amargurar mais um ano na fila? 

Está certo que o Palmeiras tinha dois jogos a mais, e apenas dois pontos à frente do Tricolor, mas também havia a Ponte Preta na disputa (que empatara com o Corinthians em zero), também na liderança, com os mesmos 19 pontos. O Santos também seguia à frente, com 18 pontos, por causa da derrota para a Portuguesa, por 1 a 0, no Pacaembu. Eram adversários demais à frente, qualquer ponto poderia fazer falta…

O Palmeiras só jogaria mais três vezes, contra Guarani, fora, Santos, fora e Portuguesa, no Parque Antártica. Complicado. A Ponte ainda teria quatro partidas: Portuguesa, em casa, São Paulo, fora, Ferroviária, fora e Botafogo, em Ribeirão Preto. Tabela difícil! E o Santos também só tinha três jogos por fazer: São Bento, fora, e os clássicos contra Corinthians e Palmeiras, na Vila Belmiro. Olha, sem vida fácil também.

E restavam cinco partidas para o Tricolor até o final do certame! Esse era o fio de esperança! Caso esmorecessem, tudo estaria perdido mesmo, mas os jogadores, dirigentes e a torcida são-paulina não abandonaram o sonho e seguiram obstinados. Era agora sim. Seria em 1970! Para isso, seria prudente vencer todas as partidas que faltavam. Difícil, mas não impossível. E para começar a boa sequência, nada melhor que enfrentar o rabeira do campeonato.

 

ARRANCADA PARA O TÍTULO

Na tarde do dia 26 de agosto, o São Paulo goleou o Botafogo por 4 a 0 no Morumbi, com gols de Forlán (mais uma vez meio sem querer: ao tentar dominar a bola, a desviou do goleiro) e de Toninho Guerreiro, três vezes! 

Uma atuação antológica do centroavante, que alcançou, naquele momento, a liderança da artilharia da competição, empatado com Douglas, do Santos, com nove gols marcados.

A chama se mantinha acessa, ainda mais com a derrota da Ponte Preta para a Portuguesa, no Moisés Lucarelli, e o empate do Santos contra o São Bento, em Sorocaba. Os jornais passaram a exibir, então, um quádruplo empate na liderança do Paulistão, a poucas rodadas do fim, todos com 19 pontos: São Paulo (14 jogos), Palmeiras (15 jogos), Ponte Preta (15 jogos) e Santos (16 jogos). Emocionante! O cenário se modificava a favor do Tricolor. 

No dia 30 de agosto, Santos e Corinthians empataram em 1 a 1 e o time praiano deu adeus às chances reais de título. Os alvinegros da capital, contudo, ainda tinham uma pequena chance, com 18 pontos somados. Isto, pois, na mesma data, o São Paulo superou o lamaçal e as dimensões reduzidas do Velho Alçapão de Sorocaba e venceu o São Bento por 3 a 0, com gols de Toninho Guerreiro, sempre ele (agora artilheiro isolado), Forlán, que se mostrava um oportunista de primeira ao acertar uma pancada indefensável de fora da área, e Édson Cegonha. 

Mas vale ressaltar que o nome do jogo fora, mais uma vez, Gérson. Os dois primeiros tentos tiveram origem em jogadas do meia. Comandados pelo Canhotinha, o Tricolor alcançou, com 21 pontos em 15 jogos, a tão sonhada liderança isolada do Campeonato Paulista de 1970.

Dois dias depois, 1º de setembro, o Palmeiras até poderia alcançar o Tricolor e dividir a posição na tabela, mas o Guarani lhe freou as ambições com o empate em 0 a 0, em Campinas. Agora, eles tinham um jogo a mais e um ponto a menos que o São Paulo.

Sem ninguém mais à sua frente, o São Paulo dependia apenas de si para pôr fim a 13 anos de dor e resignação por projetos futuros. O futuro, enfim, chegara. E alguns acreditavam piamente nisso. Forlán, inclusive, mandou até buscar o pai, do Uruguai, para que pudesse vê-lo, em breve, com a faixa de campeão pelo Tricolor, clube que ele dizia a todos ser um dos maiores do mundo.

No dia 5 de setembro, o Tricolor encararia um adversário direto pela desejada taça, a Ponte Preta do técnico Cilinho, em algo que quase poderia ser considerado como uma final de campeonato. Caso o time de Campinas vencesse, o torneio seguiria amplamente aberto, com múltiplos concorrentes.

Mais de cinquenta mil torcedores viram o São Paulo superar o rival por 2 a 0, com dois gols de Toninho Guerreiro (agora disparado na artilharia, com 12 gols), que balançou as redes primeiramente de pênalti (falta de Henrique em Terto), aos 29 minutos do primeiro tempo, e depois aos sete do segundo, com assistência de Édson Cegonha. 

O placar pode ser considerado até enganoso, pois apesar da vantagem no resultado, a partida foi equilibrada, com os dois times muito fechados até os momentos finais de cada etapa. O ponto triste do jogo foi a contusão de Gérson, atingido no tornozelo aos 25 minutos do segundo tempo e substituído por Nenê. 

No Hospital Santa Catarina, o dr. Dalzell Freire Gaspar informou ao meia que ele não teria condições de jogo nos próximos quinze dias, perdendo as rodadas finais e o possível título são-paulino. Gérson, ali, chorou.

De toda maneira, dessa forma o Tricolor chegou aos 23 pontos ganhos faltando mais duas rodadas para o fim do campeonato. O time ampliou a vantagem para Santos e Palmeiras (20) e praticamente eliminou a alvinegra de Campinas (19 pontos, mas com dois jogos por fazer). 

No dia seguinte, os outros oito times da fase final do Paulistão entraram em campo, mas só dois jogos realmente interessavam: Santos versus Palmeiras e Corinthians contra a Ferroviária. O time do Parque São Jorge venceu por 2 a 0 e se manteve vivo na competição. Tinha 20 pontos, mas ainda dois jogos por fazer, ambos em casa (Portuguesa e São Paulo). Já Santos e Palmeiras morreram de mãos dadas. Empataram em 1 a 1 na Vila Belmiro, chegando aos 21 pontos. Na verdade, o Palmeiras ainda tinha uma partida por disputar e poderia chegar aos mesmos 23 pontos do São Paulo. Já para o Santos, aquele havia sido o último jogo no torneio.

Ou seja, quando o São Paulo enfrentou o Guarani na noite do dia 9 de setembro de 1970, no Estádio Brinco de Ouro da Princesa, em Campinas, os únicos times que ainda tinham algum interesse no confronto eram Corinthians, Ponte Preta e Palmeiras, mas apenas o primeiro tinha uma chance real que não dependeria de desempate. Os corintianos precisavam vencer a Portuguesa, naquele mesmo dia, e o São Paulo não poderia vencer ou empatar com o Guarani. Assim, jogariam pelo título na rodada final justamente contra o Tricolor.

E tudo o que os tricolores não queriam era repetir o sucedido em 1967, quando, enfrentando os mesmos adversários nas duas rodadas finais, Guarani e Corinthians, o São Paulo deixou escapar, amargamente, o imediato título paulista ao sofrer um gol de empate do corintiano Benê no último minuto de jogo, fato que provocou a decisão extra contra o Santos, e o vice-campeonato.

Mas o ano é 1970, e um empate são-paulino acabaria de vez com as intenções pontepretanas e palmeirenses, embora ainda deixasse o Corinthians vivo na última partida, desde que, claro, ele vencesse a Lusa. 

 

O JOGO DO TÍTULO

Tudo se resumia, mesmo, aos dois tempos do Tricolor em Campinas. E desde os momentos iniciais o São Paulo dominou o jogo, batendo à meta do Guarani incessantemente e desperdiçando chances com Edson, Forlán, Paraná, Nenê e Toninho Guerreiro, este, duas vezes: isso em menos de cinco minutos. 

O primeiro ataque do time campineiro só veio aos 14 minutos, e em nada assustou. Pouco mais de dez minutos depois, a defesa local finalmente ruiu. Paraná recebeu a bola de Édson, pela esquerda, se livrou da marcação de Wilson e entrou na grande área, deixando para trás também Guassi. O ponta, então, encontrou Toninho livre, que bateu forte, no canto direito do goleiro Perez. Tricolor 1 a 0!

Quase em seguida, aos 33 minutos, Jurandir tocou para Paulo, que avançou pela direita e tabelou com Terto. O meia poderia ter retornado a pelota para Jurandir, que se encontrava sozinho à entrada da grande área, mas ele preferiu arriscar e, com um belo chute, surpreendeu o arqueiro do Guarani: 2 a 0 para o São Paulo!

A partir desse momento, o Tricolor relaxou um pouco e o time local até encontrou algum espaço para jogar, mas pouco ameaçou de fato a superioridade são-paulina. Foi só na segunda etapa que a partida ficou aberta de vez, com ambas as equipes buscando o gol, sem grandes preocupações com o sistema defensivo.

Aos 23 minutos, as torres de iluminação do Brinco de Ouro se apagaram, parcialmente, por instantes, e Wagner diminuiu para o Guarani. Apesar da estranha coincidência, a arbitragem validou o gol do Bugre. Na penumbra, Caravetti se estranhou com Forlán, e acabou expulso.

Apesar de contar com um jogador a menos, os campineiros pressionaram o Tricolor nos momentos finais da partida, o que elevou a tensão e a expectativa dos torcedores são-paulinos ali presentes. A lembrança de 1967 era constante.

Foi só depois do alto-falante do estádio anunciar, perto dos 40 minutos, que Valdomiro marcou um gol para a Portuguesa, abrindo o placar contra o Corinthians, que os tricolores se sentiram confortáveis para acreditar que a fila estava, sim, por acabar. Faltavam apenas alguns minutos.

Às 23 horas do dia 9 de setembro de 1970, o jejum tricolor veio ao fim e a ceia de comemoração foi um verdadeiro banquete. Alguns dos 15 mil torcedores são-paulinos mais empolgados invadiram o campo, tremulando bandeiras e abraçando os campeões.  

Muitos desabaram no gramado mesmo e choraram, outros deixaram para extravasar as emoções no vestiário, como Paulo e Gilberto. Gerson, com a perna engessada e begala à mão, tinha acompanhado a partida do banco de reservas, tentando se conter a cada chance são-paulina, e, agora, dava autógrafos, feliz, mas ainda chateado por não ter jogado.

“A vitória do São Paulo foi a vitória da fé. Fé de um grupo de homes que acreditaram num plano de trabalho diferente, dinâmico e muito realista… Ali só cabia a consciência do futebol moderno e dos seus novos rumos. O São Paulo tomou um destes caminhos”. 

Para Zezé Moreira, a conquista do São Paulo premiou a equipe mais regular e que soube trabalhar melhor o elenco, aproveitando nomes oriundos da base e com menos craques consagrados do que os concorrentes pelo título.

Não apenas Zezé, mas toda a comissão técnica são-paulina ajudou no bom desenvolvimento desses jovens valores cruciais para a campanha vitoriosa. Zezé aproveitou Paulo Nani e Gilberto Sorriso de maneira que eles nunca correram o risco de serem “queimados” pela torcida. 

E o trabalho do psicólogo João Carvalhaes também foi importante nesse aspecto. “Ele me ensinou a não tremer em campo, a ver os companheiros com igualdade. Para mim, para o Gilberto, para o Toninho II, enfim, para os mais jovens, o Professor Carvalhaes foi realmente a pessoa mais importante”, afirmou Paulo Nani à reportagem da Revista Placar.

Outro nome a ser destacado era o do Professor Hélio José Maffia, preparador físico. Na campanha são-paulina, apenas 22 atletas foram utilizados e metade jogou mais de dois terços do campeonato. Seis jogadores, Roberto Dias, Paraná, Terto, Edson Cegonha, Forlán e Toninho Guerreiro, estiveram em campo em todas as 18 partidas. 

E como bem lembrou Toninho Guerreiro: “Em cada corrida de um jogador em campo, em cada pique, havia um pouco do trabalho do professor. O Terto, que todos se espantaram em ver correndo, caindo para as pontas, me abrindo caminho para o gol, o Terto é um exemplo do trabalho do Professor Maffia”.

Toninho Guerreiro, por sua vez, demonstrou o quanto o título foi marcante também para os veteranos. Dispensado da convocação para a Copa do Mundo de 1970, de maneira até cruel, ele deu a volta por cima sagrando-se tetracampeão estadual de maneira consecutiva e também se tornando artilheiro do Paulistão por três anos seguidos, calando críticos e antigos torcedores do litoral que diziam que ele só sabia fazer gols se fosse Pelé a assisti-lo. 

Já Laudo Natel não continha a felicidade e as lágrimas. A conquista foi o presente que ele sempre quis dar a torcida são-paulina, por ela ter acreditado no sonho dele, no sonho do Morumbi, nos duros anos dessa empreitada. 

“Agora, já posso pendurar as chuteiras e dar meu lugar a dirigentes novos”. Laudo deixaria a presidência do Tricolor no dia 15 de março de 1971, dando lugar a Henri Aidar após sete mandatos e quase 13 anos de administração. A saída do patrono são-paulino, dizia ele mesmo, significaria uma nova era para o Tricolor, uma nova era dourada e banhada em conquistas, frutos da vanguardia que foi imaginar e realizar o Estádio Cícero Pompeu de Toledo.

O Campeonato, porém, ainda não havia sido concluído, de fato. Restava uma rodada. Mas isso não significava que a festa já tinha acabado. Ela só durou um pouco mais e com um convidado novo: o Corinthians. Coube ao rival entregar as faixas de campeão a cada um dos jogadores tricolores no último jogo do Paulistão de 1970.

No dia 13 de setembro, quase 80 mil pessoas (63.373 pagantes e 79.483 presentes, entre menores e convidados – recorde do campeonato) foram ao Estádio Cícero Pompeu de Toledo, a tão sonhada casa são-paulina, recepcionar e saudar cada um dos campeões do Tricolor. E, de quebra, se desse para vencer o rival, ninguém iria reclamar, também.

 

FAIXA DE CAMPEÃO ENTREGUE PELO RIVAL

1O time são-paulino adentrou ao gramado do Morumbi já com uma faixa no peito, com a inscrição “Campeão 1970” e o escudo do clube. Depois de ser recepcionado pelos dirigentes e autoridades políticas e esportivas, os tricolores receberam ramos de rosas que, ao se espalharem em todas as direções do estádio, foram atiradas para os torcedores nas gerais, em forma de homenagem à torcida.

Os jogadores do Tricolor foram alinhados, então, para a execução do hino nacional, performado pela fanfarra da Prefeitura Municipal de Mairiporã, e também para a tradicional pose para os fotógrafos. A foto dos campeões contou com todo o elenco do clube na vitoriosa campanha: os 22 atletas que disputaram ao menos uma partida na competição.

Durante e após o curto aquecimento no campo, os são-paulinos ainda foram agraciados com mais duas faixas de campeões, uma ofertada pela Rádio Nacional, e outra pela Rádio Tupi, em parceria com a Malhas Athleta.  

Como se vê, a cerimônia das faixas não foi como o esperado, como sempre ocorria em situações assim: com o time adversário presenteando os vencedores, pessoalmente. Não se sabe o motivo, mas o Corinthians entrou em campo quase despercebidamente. 

Mas tudo bem, com mais faixas de campeão no peito, os onze titulares se alinharam para mais uma sessão de fotos, e convidaram também, para fazer parte da cena história, um dos principais heróis dessa conquista: o meia Gérson, ainda contundido e fora da partida, mas devidamente trajado.

O Canhotinha ainda foi homenageado com o direito de iniciar a partida, com o primeiro toque na bola, para depois, ao deixar o gramado, ser extremamente aplaudido pela torcida são-paulina.

Com a bola rolando, a partida foi bem desenvolta, com oportunidades para as duas equipes. Com menos de quinze minutos, o Tricolor desperdiçou uma boa chance com Toninho Guerreiro, depois de um lançamento primoroso de Nenê. Sérgio, arqueiro são-paulino, por sua vez, fez duas boas defesas, em menos de um minuto, pouco depois.

Perto do final da primeira etapa, Forlán quase pôs o São Paulo à frente no placar, com um tirambaço de fora da área, mas a bola passou por cima do travessão por poucos centímetros. 

No segundo tempo, aos 20 minutos, Paraná encontrou Terto livre e passou-lhe a redonda com maestria. O atacante bateu forte e bem colocado. O goleiro adversário, Ado, não conseguiu defender a bola definitivamente, e o mesmo Paraná, que iniciara a jogada e que não havia balançado as redes naquele torneio até ali, aproveitou o rebote e mandou a pelota para o fundo do gol! 

E, aos 44 minutos, para expurgar de vez o trauma de 1967, o goleiro tricolor, Sérgio, fez uma excelente defesa no forte e preciso chute de Benê. Dessa vez, ao contrário de 1967, não haveria sequer o empate. Fim de jogo, fim do campeonato, fim do jejum! Era o início de uma nova era…

“Está é uma festa soberba e inesquecível. São Paulo e os seus esportistas estavam realmente a merecer manifestação de tal vulto, verdadeira glorificação a um clube que tudo vem fazendo, entre os seus pares, para honrar o esporte do Estado e do País”. – Laudo Natel.

Esta história começa no dia 25 de janeiro de 1970, mas ela poderia ter se iniciado antes. Poderíamos relembrar os fatos a partir de 2 de outubro de 1960, ou de 15 de agosto de 1952, ou ainda ir mais a fundo no tempo e regressar mais quarenta anos da data escolhida, 25 de janeiro de 1930.
Mas esta não é a história da inauguração do Morumbi, ou da aquisição desse terreno, e nem mesmo é o relato da fundação do São Paulo Futebol Clube. E, embora não seja um conto de renascimento, como ocorrido com o Tricolor em 1935, é um relato do reavivamento de um sentimento quase sempre tão comum a todo são-paulino, o sentimento de ser campeão. 
É a história da transformação de esperança em realidade.
Era essa a sensação dos tricolores naquela tarde de 25 de janeiro de 1970, quando “O Mais Querido” concluiu e inaugurou, definitivamente, o Estádio Cícero Pompeu de Toledo, naquela partida amistosa contra o time do Porto, de Portugal, que acabou empatada em 1 a 1, gol de Miruca. 
Até esse dia, foram quase 18 anos de muito suor e anseios. Muita dedicação e incertezas. Muito ferro e concreto. Muito de muita coisa, inclusive derrotas. Sim, derrotas. O pouco que havia era justamente de vitórias, de conquistas, de títulos.
Claro, existiram bons momentos. O São Paulo foi campeão paulista de 1953 e 1957. Até ali, as obras do Gigante do Morumbi ainda não eram tão pesadas e onerosas. Os tricolores ainda viram grandes times do futebol tombarem perante o fruto de sua maior paixão, como quando, em 1963, o Tricolor derrubou três campeões mundiais. 
Primeiro, o Penãrol: vitória por 5 a 3 em Montevidéu, triunfo que causou forte comoção nos locais, que não queriam deixar os são-paulinos regressarem à própria terra enquanto não lhes dessem uma chance de revanche.
Depois, o Santos de Pelé, que, em um Pacaembu lotado, tomou de 4 a 1 e, para evitar desgraça maior, apelou para o cai-cai e fugiu de campo. 
Por fim, o Real Madrid, de Di Stéfano, Puskas e Evaristo, derrotado por 2 a 1 na icônica Pequena Copa do Mundo, realizada na Venezuela. 
Vieram também grandes vitórias na Europa, com os times do Furacão e do Colombino de 1969, quando novamente o Real Madrid não foi páreo para o Coração de Cinco Pontas. Mas tudo isso já pertencia às linhas do passado, um tanto quanto já distante. O que pesava mesmo no fundo dos corações tricolores eram os vice-campeonatos paulistas de 1962, 1963 e, principalmente, 1967.
O são-paulino queria ser campeão ali na sua terra, ali com sua gente, ver com os próprios olhos e sentir com a própria carne essa emoção. Porém, os treze anos de ferro foram implacáveis e não deram chance de isso acontecer nem com grandes ídolos como Bellini e Prado.
Desses maiores expoentes, que atravessaram década, ou quase uma década, defendendo o Tricolor, poucos tiveram a oportunidade de saciar esse desejo. Foi o caso de Roberto Dias e Benê, graças à conquista do Campeonato Paulista de 1970.
E é essa a história que aqui será relembrada.
Ela só pode ser lembrada hoje devido a ação de homens como Laudo Natel, Porphyrio da Paz e Manuel Raymundo Paes de Almeida, que sustentaram nas costas, apesar das inúmeras vozes e situações contrárias, o foco da coletividade são-paulina. 
Sim, por muito tempo, o anseio de ter a própria casa era mais importante do que qualquer título. Se fazia o possível primeiro, e o impossível depois. Isso trazia dor, mas fortes se tornaram aqueles que a suportaram. Com o Estádio do Morumbi pronto a diretoria tricolor tratou de por fim à incomoda seca.
Ainda em 1969, Gérson, o Canhotinha de Ouro, foi contratado junto ao Botafogo. No mesmo ano, o artilheiro dos últimos dois Campeonatos Paulistas, Toninho Guerreiro, também chegou ao Tricolor vindo do Santos, depois de desavenças com o clube do litoral referentes a acordos financeiros. Mas ainda era pouco, e o que o São Paulo almejava não o era. 
Era preciso ser campeão. Viriam, então, ao longo de 1970, dois nomes de nível internacional, de seleção semifinalista da Copa do Mundo, dois ídolos de primeiro patamar: Pablo Forlán e Pedro Rocha, contratados do Peñarol, do Uruguai. O primeiro, por 120 mil dólares, e o segundo, por 150 mil. 
Pedro Rocha, a maior contratação, contudo, não disputaria uma partida sequer do Campeonato Paulista que marcaria o fim do sofrimento são-paulino. A negociação do jogador junto ao time uruguaio e ao empresário Juan Figger foi longa e complexa, e o craque só foi contratado pelo Tricolor para a disputa do Torneio Roberto Gomes Pedrosa após o estadual.
O Campeonato Paulista de 1970 foi de tiro curto, ao menos para os clubes grandes. Na primeira fase, chamada de Paulistinha, onze times se enfrentaram em turno e returno, e após um triangular para desempate de posições, cinco times se classificaram para a fase final, denominada Paulistão. Assim, Guarani, Ferroviária, Botafogo, São Bento e Ponte Preta se juntaram a São Paulo, Santos, Palmeiras, Corinthians e Portuguesa.
Esses dez clubes se enfrentaram em turno e returno no sistema de pontos corridos. Um regulamento simples e prático, sem campeões de turno, mata-matas ou nada do tipo. O torneio se iniciou logo após a disputa da Copa do Mundo do México. Em meio a um cenário de euforia pela conquista do tricampeonato mundial pela Seleção Brasileira, o Tricolor começou a jornada pelo fim de seu calvário justamente na sua casa recém-concluída. 
Mas os tricolores não estavam nem um pouco confiantes no time. 
O São Paulo estava “iniciando a disputa de outro campeonato paulista do mesmo modo como o tem feito nos últimos dez anos: desacreditado pela própria torcida, sem muitas chances de chegar ao título”, como afirmou o jornal O Estado de S. Paulo de 28 de junho de 1970.
Foi nesse dia que o São Paulo inaugurou sua casa totalmente nova e completa em partidas do Paulistão vencendo o São Bento por 1 a 0, mais uma vez com gol de Miruca, aos 13 minutos do primeiro tempo. 
Gérson não jogou, ainda estava de férias pelo feito com a Seleção. Zezé Moreira escalara o time com Picasso no gol; Pablo Forlán, Jurandir, Roberto Dias e Tenente na defesa; Édson Cegonha e Nenê no meio de campo; Miruca (depois Paulo Nani), Terto, Toninho Guerreiro (recuperado de uma contusão sofrida contra o Red Star, em amistoso realizado na França) e Paraná no ataque.
Apesar da vitória, o time são-paulino foi muito vaiado pela torcida nos quinze minutos finais de jogo, momentos em que Picasso era o grande destaque da partida, impedindo o empate do time adversário. 
Mesmo com um prometido “bicho” de 500 cruzeiros pela vitória, o São Paulo perdeu a primeira partida no campeonato já na segunda rodada, contra a Portuguesa, no Parque Antártica, no dia 1 de julho. O gol de Roberto Dias, de pênalti, empatando o jogo no começo do segundo tempo, não bastou: a Lusa fez mais um e venceu por 2 a 1, apesar da pressão são-paulina no fim do confronto.
Cabe pontuar a boa atuação de Forlán, que abusou da velocidade pelo setor direito do campo. Já a culpa pelo resultado caiu, claro, no colo do técnico Zezé, que adotou o 4-3-3 na partida, mantendo Nenê e Lourival (escalado no lugar de Miruca) no meio de campo, ao invés do esperado 4-2-4, com um desses dois atletas mais à frente. 
No terceiro embate, que marcou as estreias do grande goleiro Sérgio Valentim e do incansável Gilberto Sorriso, se não é possível chamar de tropeço, em vista o bom time adversário, também não dá para dizer que foi um bom resultado: 2 a 2 contra a Ponte Preta, no dia 5 de julho, no Moisés Lucarelli. 
Terto abrira o placar para o Tricolor, no primeiro tempo, mas a Ponte empatou com pouco tempo de jogo na segunda etapa. Toninho Guerreiro, então, colocou o São Paulo de novo em vantagem, aos 27 minutos, mas, para surpresa dele, o atacante foi substituído por Everaldo com pouco mais de dez minutos para o fim do jogo. Contrariado pela substituição, Toninho viu, do lado de fora do campo, a Ponte Preta empatar a partida aos 40 minutos, com Manfrini.
Após o jogo, Toninho não se conteve, dizendo que não aceitaria humilhações, pois ele, um atacante com mais de 800 gols na carreira (nas contas do atleta), não era nenhum perna de pau e que, com ele durante os 90 minutos, o São Paulo não teria se descontrolado e voltaria de Campinas com a vitória. 
O clima estava quente, mas nem tanto para Zezé Moreira, que preferiu não dar corda no assunto. 
O time só emplacou mesmo a partir do retorno de Gérson aos gramados. Com seu merecido descanso concluído (e apesar dos comentários desnecessários ditos ainda no Rio de Janeiro de que gostaria de encerrar a carreira no Fluminense, mas que cumpriria o contrato com o São Paulo), o camisa 10 são-paulino começaria a fazer a diferença.
E nada melhor que começar essa campanha com um acirrado confronto. Santos versus São Paulo, Pelé x Gersón – o primeiro após a conquista do Tri Mundial de 1970. 
Não deu para Pelé. “Com lançamentos perfeitos, boa cobertura à defesa e comandando a equipe”, o Canhotinha levou o São Paulo à vitória contra o Santos por 3 a 2, no dia 12 de julho, no Parque Antártica (os santistas decidiram mandar o jogo na capital paulista, mas em campo neutro). Carlos Alberto Torres, marcando contra, Miruca e Édson Cegonha, de cabeça, foram os autores dos gols. 
O esquema tático de Zezé Moreira, em especial no setor do meio de campo, antes muito criticado, caiu perfeitamente bem quando desempenhado por Gérson. O ídolo tinha tanta moral com a cúpula são-paulina que a diretoria, poucos dias depois, ofereceu a ele e à esposa um banquete, uma homenagem oficial pela conquista com a Seleção Brasileira.
Mas voltando ao relvado… A essa altura, o time ocupava a terceira posição na tabela, junto a Guarani e Corinthians, com cinco pontos, e atrás da Ponte Preta, que tinha seis pontos, e da Portuguesa, de sete pontos, mas que também tinha uma partida a mais já realizada.
No dia 16 de julho, quinta-feira, o São Paulo retornou mais uma vez ao Parque Antártica, agora como mandante, em confronto contra a Ferroviária. O Pacaembu passava por reformas e, como o jogo seria à noite – o sistema de iluminação do Morumbi só ficaria pronto em 1971 –, a solução encontrada foi a utilização do estádio palmeirense para a realização do jogo.
Apesar de Zezé Moreira reconhecer abertamente que não conhecida nada do time araraquarense antes do começo da partida, o São Paulo venceu a Ferroviária por 2 a 1, com dois gols de Toninho Guerreiro no segundo tempo. Com a vitória, a liderança na tabela foi alcançada em um empate tríplice com a Lusa e o Guarani (este último, com uma partida a mais realizada). Tudo aparentemente muito bom, mas Gérson sentira uma antiga contusão, uma distensão muscular na coxa direita e passou a ser dúvida para o embate seguinte, justamente um clássico.
O primeiro Majestoso da nova era do Morumbi foi disputado no dia 19 de julho sob os olhares de 45.063 pagantes no estádio, torcedores estes que estavam esperançosos em ver um grande duelo entre Gérson e Rivellino, mas ambos não estavam nas melhores condições físicas. 
O Canhotinha teve que ser, inclusive, substituído por Nenê, aos 33 minutos da etapa final.
Depois de sair na frente, com um gol de Toninho Guerreiro aos nove minutos do primeiro tempo, o Corinthians, treinado pelo ilustre Dino Sani, empatou o jogo com um tento de Lima, de falta, aos oito minutos da etapa final. E o jogo acabou assim, no 1 a 1. 
O ponto polêmico da partida foi justamente o gol de empate corintiano. Pouquíssimas pessoas no Morumbi teriam visto a bola, chutada fortemente por Lima, ultrapassar a linha final da meta tricolor. Ainda assim, o bandeirinha Renato Oliveira Braga e o árbitro Aldo Aníbal Oviedo validaram o gol, comprovado por fotos de veículos de imprensa.
Com a vitória da Ponte Preta sobre a Portuguesa, por 2 a 1, e do Santos sobre o Guarani, por 5 a 2, naquela rodada, o Tricolor se manteve na liderança do torneio, mas empatado justamente com a Ponte, que tinha um jogo a menos, e o Santos, todos com oito pontos ganhos.
Sem Gérson, sob tratamento com o médico Dalzell Freire Gaspar, o Tricolor viajou para Ribeirão Preto, no dia 26 de julho, onde enfrentou o lanterna do Paulistão, o Botafogo local, no sempre complicado de encarar Estádio Santa Cruz. O time, porém, se saiu bem e venceu por 2 a 1, ambos os gols marcados no primeiro tempo. O primeiro, por Édson Cegonha, depois de cobrança de escanteio e rebatida da zaga, e o segundo por Terto, no rebote de uma cobrança de falta de Dias que acertou a trave.
Nesse momento, o campeonato ainda estava muito embolado. A Ponte tirou seu jogo atrasado, venceu a Ferroviária e, ao empatar com o Palmeiras em 0 a 0, assumiu a liderança isolada do Paulistão, com 11 pontos. São Paulo, Santos e Corinthians seguiam na cola do time campineiro, com dez pontos.
Na volta do interior, o São Paulo teve mais um clássico pela frente no dia 29 de julho: Choque-Rei na casa do rival. O Tricolor agora estava tinindo e com o time titular completo, com o Canhotinha liberado pelo Departamento Médico: Sérgio; Forlán, Jurandir, Roberto Dias e Gilberto Sorriso; Édson Cegonha e Gérson; Paulo Nani, Terto, Toninho Guerreiro e Paraná. 
Apesar do domínio são-paulino, que desperdiçou várias oportunidades de gol, a partida se manteve truncada na maior parte do tempo, e a vitória só se caracterizou no terço final da segunda etapa, com o gol de Terto, marcado aos 33 minutos, que furou o sistema defensivo montado pelo técnico Rubens Minelli. Os palmeirenses muito reclamaram do gol, validado pelo árbitro Armando Marques, alegando toque de mão do atacante são-paulino no lance em que, com o peito, ele encobrira o goleiro Leão.
Sem levar em conta as lamúrias do rival, a imprensa especializada foi categórica em afirmar que o resultado foi justo para com o melhor desempenho são-paulino em campo, que chamou a atenção também pela mobilidade tática pregada por Zezé.
O time, durante os 90 minutos, variou constantemente do 4-3-3 para o 4-4-2 ou até o 4-2-4, graças aos incansáveis Paulo e Toninho, que se revezavam nas funções correspondentemente necessárias para cada sistema.
Alguns dias depois, Zezé falaria aos repórteres que, no time dele, só quatro jogadores tinham posição fixa, sendo um deles o goleiro (também o lateral-direito, um dos volantes e o ponta Terto). Todos os demais tinham liberdade, ao menos teórica, de mudar de posicionamento e ajudar os companheiros em outras funções. O que seria praticamente um carrossel, quatro anos antes daquele famoso, o holandês. Ainda que, na prática, o time dependesse, quase exclusivamente, do talento de Gérson para encontrar as melhores chances de gol.
De toda forma, a vitória no clássico valeu ao Tricolor a primeira posição no campeonato, com 12 pontos, ainda que dividindo o posto com a Ponte Preta, que ficou no empate sem gols com o Botafogo de Ribeirão em Campinas. 
De volta ao Morumbi, no dia 1º de agosto, o São Paulo tropeçou no Guarani comandado pelo antigo e respeitoso ídolo Armando Renganeschi. Não foi o suficiente para cair e perder, mas o empate em 0 a 0 prejudicou o time na corrida pela liderança com a Ponte Preta que, no dia seguinte, venceu o São Bento no Moisés Lucarelli por 1 a 0 e reassumiu o primeiro lugar na tabela de classificação, com 14 pontos, contra 13 do Tricolor.
O crucial, referente a esse jogo, foi o desempenho são-paulino, muito abaixo do esperado. Não na produção ofensiva – o time produziu boas chances –, mas pelo pífio aproveitamento nos arremates ao gol. A partida foi considerada tão ruim que, mesmo brigando pela ponta da tabela, vaias ecoaram pelas arquibancadas do Estádio Cícero Pompeu de Toledo, ao final do jogo.
Ao término do primeiro turno do Campeonato Paulista, a luta pelo título estava parelha entre a Ponte e o Tricolor, mas também com Santos e Corinthians na cola dos dois primeiros, com 11 pontos. A classificação apontava, ainda, Ferroviária, com 10 pontos; Palmeiras, nove; Portuguesa e Guarani, oito; São Bento, cinco, e o Botafogo de Ribeirão na lanterna, com apenas um ponto.
Para o Tricolor, o returno começou com casa cheia no dia 9 de agosto. No Morumbi, com 53.288 pagantes, os são-paulinos viram o Santos sair na frente do placar com Douglas, aos 30 do primeiro tempo. Foi um começo abaixo do esperado para o time da casa, que viu, negado pelo árbitro, um pênalti cometido pelo goleiro Joel em Terto. Perto do fim da primeira etapa, aos 41, porém, Toninho Guerreiro disputou com Pelé e, com uma bela bicicleta, empatou, 1 a 1. 
Grande nome naquele jogo, Toninho virou a partida na segunda etapa, aos 25, depois do encontrão do volante Edson com o goleiro Joel. Doze minutos depois, Terto ampliou para o São Paulo, no contra-ataque, por meio de um excepcional lançamento de Gérson: 3 a 1. O Santos ainda diminuiu a vantagem já no finzinho da partida, novamente com Douglas, mas ficou por isso. 
Ótimo resultado para os são-paulinos, que viram a Ponte Preta acumular pontos (e uma partida a mais) ao vencer o São Bento, em Sorocaba e empatar com o Palmeiras, em Campinas. A briga pela liderança estava, ali, 17 a 15 para os pontepretanos. Apesar disso, Pelé apontava, para a imprensa, que o Tricolor seria o provável campeão da temporada. Ou enfim, talvez só tentasse justificar a derrota.
Contudo, a disputa pelo título poderia ter em muito se complicado para o Tricolor na rodada dos dias 15 e 16 de agosto. Desfalcado do lateral Jurandir, contundido (e com Eduardo no lugar dele), o São Paulo foi a Araraquara enfrentar a Ferroviária e voltou de lá surpreendido com uma derrota por 2 a 0. O primeiro gol adversário, inclusive, contou com uma infelicidade tremenda do arqueiro Sérgio, absolutamente seguro em quase toda a campanha do time, mas que, enganado pelo quique no gramado, aceitou a bola a passar pelo meio das pernas naquele momento.  
Detalhe: a Ferrinha havia sido goleada pelo Santos, por 5 a 0, dias antes… Sorte que o mesmo Santos também tirou os dois pontos da Ponte Preta, vencendo por 1 a 0 em Campinas. 
Bom, sorte mesmo? Com esses placares, agora era o Santos (13 jogos) que dividia a liderança da tabela com a Ponte Preta (12 jogos), com 17 pontos cada. E para complicar mais, o Palmeiras (13 jogos) alcançara o Tricolor, com 15 pontos, e até a Ferroviária (13 jogos) e o Corinthians (12 jogos) ameaçavam o posto são-paulino, com 14 pontos, ambos. A esperança são-paulina residia em ter uma ou duas partidas a menos em relação aos adversários. Mas partida a menos era aquilo: ainda era preciso vencê-las para significar algo positivo.
Não havia muito tempo para respirar e recuperar as forças. Ainda mais com a FPF marcando o próximo jogo para o meio da semana, enquanto o clube esperava que fosse agendada para o sábado ou domingo. 
Na tarde da quarta-feira, 19 de agosto, o São Paulo recebeu a Portuguesa no Morumbi e, apesar das retrancas de ambos os lados, venceu por 1 a 0, gol acidental de Pablo Forlán no comecinho do jogo. O lateral, da quina da grande área, tentou cruzar, mas a bola acabou foi encobrindo o goleiro Orlando, golaço.  
O Tricolor, dessa forma, fez sua parte, e Santos e Ponte Preta apenas empataram em atuações fora de casa contra Botafogo e Guarani. Ainda assim, seguiram na liderança por um ponto de vantagem em relação a São Paulo e Palmeiras, que vencera a Ferroviária.
O São Paulo poderia selar seu destino de vez no Choque-Rei do dia 23 de agosto. E o mesmo poderia ser dito sobre o rival, na mesma partida. Ambos poderiam ir ao céu, ou ao inferno, dependendo do resultado da peleja, ou da forma de ler a tabela de classificação: por pontos ganhos (empatados), ou por pontos perdidos (Tricolor à frente).
Contra o adversário direto, o Tricolor atuou praticamente completo, desfalcado apenas do lateral-esquerdo Gilberto Sorriso, que sofria com dores nas costas. Tenente jogou no lugar dele. 
Mesmo assim, e apesar de ter controlado a maior parte do jogo e dominado o adversário, o São Paulo não conseguiu penetrar a defesa palmeirense, com o oponente inteiramente recuado desde o gol de Dudu, aos 5 minutos do primeiro tempo. 
Para piorar, a arbitragem prejudicou o Tricolor ao negar-lhe um pênalti cometido por Baldocchi em Paraná, na metade da segunda etapa. Fim de jogo, vitória do time de Rubens Minelli por 1 a 0.
Duas derrotas em três jogos… Teria acabado o sonho do título? O sonho de voltar a ser campeão, após quase 13 anos de duros insucessos? O torcedor são-paulino teria que amargurar mais um ano na fila? 
Está certo que o Palmeiras tinha dois jogos a mais, e apenas dois pontos à frente do Tricolor, mas também havia a Ponte Preta na disputa (que empatara com o Corinthians em zero), também na liderança, com os mesmos 19 pontos. O Santos também seguia à frente, com 18 pontos, por causa da derrota para a Portuguesa, por 1 a 0, no Pacaembu.
Eram adversários demais à frente, qualquer ponto poderia fazer falta…
O Palmeiras só jogaria mais três vezes, contra Guarani, fora, Santos, fora e Portuguesa, no Parque Antártica. Complicado. A Ponte ainda teria quatro partidas: Portuguesa, em casa, São Paulo, fora, Ferroviária, fora e Botafogo, em Ribeirão Preto. Tabela difícil! E o Santos também só tinha três jogos por fazer: São Bento, fora, e os clássicos contra Corinthians e Palmeiras, na Vila Belmiro. Olha, sem vida fácil também.
E restavam cinco partidas para o Tricolor até o final do certame! Esse era o fio de esperança! Caso esmorecessem, tudo estaria perdido mesmo, mas os jogadores, dirigentes e a torcida são-paulina não abandonaram o sonho e seguiram obstinados. Era agora sim. Seria em 1970!
Para isso, seria prudente vencer todas as partidas que faltavam. Difícil, mas não impossível. E para começar a boa sequência, nada melhor que enfrentar o rabeira do campeonato.
Na tarde do dia 26 de agosto, o São Paulo goleou o Botafogo por 4 a 0 no Morumbi, com gols de Forlán (mais uma vez meio sem querer: ao tentar dominar a bola, a desviou do goleiro) e de Toninho Guerreiro, três vezes! 
Uma atuação antológica do centroavante, que alcançou, naquele momento, a liderança da artilharia da competição, empatado com Douglas, do Santos, com nove gols marcados.
A chama se mantinha acessa, ainda mais com a derrota da Ponte Preta para a Portuguesa, no Moisés Lucarelli, e o empate do Santos contra o São Bento, em Sorocaba. Os jornais passaram a exibir, então, um quádruplo empate na liderança do Paulistão, a poucas rodadas do fim, todos com 19 pontos: São Paulo (14 jogos), Palmeiras (15 jogos), Ponte Preta (15 jogos) e Santos (16 jogos). Emocionante! 
O cenário se modificava a favor do Tricolor. 
No dia 30 de agosto, Santos e Corinthians empataram em 1 a 1 e o time praiano deu adeus às chances reais de título. Os alvinegros da capital, contudo, ainda tinham uma pequena chance, com 18 pontos somados. Isto, pois, na mesma data, o São Paulo superou o lamaçal e as dimensões reduzidas do Velho Alçapão de Sorocaba e venceu o São Bento por 3 a 0, com gols de Toninho Guerreiro, sempre ele (agora artilheiro isolado), Forlán, que se mostrava um oportunista de primeira ao acertar uma pancada indefensável de fora da área, e Édson Cegonha. 
Mas vale ressaltar que o nome do jogo fora, mais uma vez, Gérson. Os dois primeiros tentos tiveram origem em jogadas do meia. Comandados pelo Canhotinha, o Tricolor alcançou, com 21 pontos em 15 jogos, a tão sonhada liderança isolada do Campeonato Paulista de 1970.
Dois dias depois, 1º de setembro, o Palmeiras até poderia alcançar o Tricolor e dividir a posição na tabela, mas o Guarani lhe freou as ambições com o empate em 0 a 0, em Campinas. Agora, eles tinham um jogo a mais e um ponto a menos que o São Paulo.
Sem ninguém mais à sua frente, o São Paulo dependia apenas de si para pôr fim a 13 anos de dor e resignação por projetos futuros. O futuro, enfim, chegara. E alguns acreditavam piamente nisso. Forlán, inclusive, mandou até buscar o pai, do Uruguai, para que pudesse vê-lo, em breve, com a faixa de campeão pelo Tricolor, clube que ele dizia a todos ser um dos maiores do mundo.
No dia 5 de setembro, o Tricolor encararia um adversário direto pela desejada taça, a Ponte Preta do técnico Cilinho, em algo que quase poderia ser considerado como uma final de campeonato. Caso o time de Campinas vencesse, o torneio seguiria amplamente aberto, com múltiplos concorrentes.
Mais de cinquenta mil torcedores viram o São Paulo superar o rival por 2 a 0, com dois gols de Toninho Guerreiro (agora disparado na artilharia, com 12 gols), que balançou as redes primeiramente de pênalti (falta de Henrique em Terto), aos 29 minutos do primeiro tempo, e depois aos sete do segundo, com assistência de Édson Cegonha. 
O placar pode ser considerado até enganoso, pois apesar da vantagem no resultado, a partida foi equilibrada, com os dois times muito fechados até os momentos finais de cada etapa. O ponto triste do jogo foi a contusão de Gérson, atingido no tornozelo aos 25 minutos do segundo tempo e substituído por Nenê. 
No Hospital Santa Catarina, o dr. Dalzell Freire Gaspar informou ao meia que ele não teria condições de jogo nos próximos quinze dias, perdendo as rodadas finais e o possível título são-paulino. Gérson, ali, chorou.
De toda maneira, dessa forma o Tricolor chegou aos 23 pontos ganhos faltando mais duas rodadas para o fim do campeonato. O time ampliou a vantagem para Santos e Palmeiras (20) e praticamente eliminou a alvinegra de Campinas (19 pontos, mas com dois jogos por fazer). 
No dia seguinte, os outros oito times da fase final do Paulistão entraram em campo, mas só dois jogos realmente interessavam: Santos versus Palmeiras e Corinthians contra a Ferroviária. O time do Parque São Jorge venceu por 2 a 0 e se manteve vivo na competição. Tinha 20 pontos, mas ainda dois jogos por fazer, ambos em casa (Portuguesa e São Paulo). Já Santos e Palmeiras morreram de mãos dadas. Empataram em 1 a 1 na Vila Belmiro, chegando aos 21 pontos. Na verdade, o Palmeiras ainda tinha uma partida por disputar e poderia chegar aos mesmos 23 pontos do São Paulo. Já para o Santos, aquele havia sido o último jogo no torneio.
Ou seja, quando o São Paulo enfrentou o Guarani na noite do dia 9 de setembro de 1970, no Estádio Brinco de Ouro da Princesa, em Campinas, os únicos times que ainda tinham algum interesse no confronto eram Corinthians, Ponte Preta e Palmeiras, mas apenas o primeiro tinha uma chance real que não dependeria de desempate. Os corintianos precisavam vencer a Portuguesa, naquele mesmo dia, e o São Paulo não poderia vencer ou empatar com o Guarani. Assim, jogariam pelo título na rodada final justamente contra o Tricolor.
E tudo o que os tricolores não queriam era repetir o sucedido em 1967, quando, enfrentando os mesmos adversários nas duas rodadas finais, Guarani e Corinthians, o São Paulo deixou escapar, amargamente, o imediato título paulista ao sofrer um gol de empate do corintiano Benê no último minuto de jogo, fato que provocou a decisão extra contra o Santos, e o vice-campeonato.
Mas o ano é 1970, e um empate são-paulino acabaria de vez com as intenções pontepretanas e palmeirenses, embora ainda deixasse o Corinthians vivo na última partida, desde que, claro, ele vencesse a Lusa. 
Tudo se resumia, mesmo, aos dois tempos do Tricolor em Campinas. E desde os momentos iniciais o São Paulo dominou o jogo, batendo à meta do Guarani incessantemente e desperdiçando chances com Edson, Forlán, Paraná, Nenê e Toninho Guerreiro, este, duas vezes: isso em menos de cinco minutos. 
O primeiro ataque do time campineiro só veio aos 14 minutos, e em nada assustou. Pouco mais de dez minutos depois, a defesa local finalmente ruiu. Paraná recebeu a bola de Édson, pela esquerda, se livrou da marcação de Wilson e entrou na grande área, deixando para trás também Guassi. O ponta, então, encontrou Toninho livre, que bateu forte, no canto direito do goleiro Perez. Tricolor 1 a 0!
Quase em seguida, aos 33 minutos, Jurandir tocou para Paulo, que avançou pela direita e tabelou com Terto. O meia poderia ter retornado a pelota para Jurandir, que se encontrava sozinho à entrada da grande área, mas ele preferiu arriscar e, com um belo chute, surpreendeu o arqueiro do Guarani: 2 a 0 para o São Paulo!
A partir desse momento, o Tricolor relaxou um pouco e o time local até encontrou algum espaço para jogar, mas pouco ameaçou de fato a superioridade são-paulina. Foi só na segunda etapa que a partida ficou aberta de vez, com ambas as equipes buscando o gol, sem grandes preocupações com o sistema defensivo.
Aos 23 minutos, as torres de iluminação do Brinco de Ouro se apagaram, parcialmente, por instantes, e Wagner diminuiu para o Guarani. Apesar da estranha coincidência, a arbitragem validou o gol do Bugre. Na penumbra, Caravetti se estranhou com Forlán, e acabou expulso.
Apesar de contar com um jogador a menos, os campineiros pressionaram o Tricolor nos momentos finais da partida, o que elevou a tensão e a expectativa dos torcedores são-paulinos ali presentes. A lembrança de 1967 era constante.
Foi só depois do alto-falante do estádio anunciar, perto dos 40 minutos, que Valdomiro marcou um gol para a Portuguesa, abrindo o placar contra o Corinthians, que os tricolores se sentiram confortáveis para acreditar que a fila estava, sim, por acabar. Faltavam apenas alguns minutos.
Às 23 horas do dia 9 de setembro de 1970, o jejum tricolor veio ao fim e a ceia de comemoração foi um verdadeiro banquete. Alguns dos 15 mil torcedores são-paulinos mais empolgados invadiram o campo, tremulando bandeiras e abraçando os campeões.  
Muitos desabaram no gramado mesmo e choraram, outros deixaram para extravasar as emoções no vestiário, como Paulo e Gilberto. Gerson, com a perna engessada e begala à mão, tinha acompanhado a partida do banco de reservas, tentando se conter a cada chance são-paulina, e, agora, dava autógrafos, feliz, mas ainda chateado por não ter jogado.
“A vitória do São Paulo foi a vitória da fé. Fé de um grupo de homes que acreditaram num plano de trabalho diferente, dinâmico e muito realista… Ali só cabia a consciência do futebol moderno e dos seus novos rumos. O São Paulo tomou um destes caminhos”. 
Para Zezé Moreira, a conquista do São Paulo premiou a equipe mais regular e que soube trabalhar melhor o elenco, aproveitando nomes oriundos da base e com menos craques consagrados do que os concorrentes pelo título.
Não apenas Zezé, mas toda a comissão técnica são-paulina ajudou no bom desenvolvimento desses jovens valores cruciais para a campanha vitoriosa. Zezé aproveitou Paulo Nani e Gilberto Sorriso de maneira que eles nunca correram o risco de serem “queimados” pela torcida. 
E o trabalho do psicólogo João Carvalhaes também foi importante nesse aspecto. “Ele me ensinou a não tremer em campo, a ver os companheiros com igualdade. Para mim, para o Gilberto, para o Toninho II, enfim, para os mais jovens, o Professor Carvalhaes foi realmente a pessoa mais importante”, afirmou Paulo Nani à reportagem da Revista Placar.
Outro nome a ser destacado era o do Professor Hélio José Maffia, preparador físico. Na campanha são-paulina, apenas 22 atletas foram utilizados e metade jogou mais de dois terços do campeonato. Seis jogadores, Roberto Dias, Paraná, Terto, Edson Cegonha, Forlán e Toninho Guerreiro, estiveram em campo em todas as 18 partidas. 
E como bem lembrou Toninho Guerreiro: “Em cada corrida de um jogador em campo, em cada pique, havia um pouco do trabalho do professor. O Terto, que todos se espantaram em ver correndo, caindo para as pontas, me abrindo caminho para o gol, o Terto é um exemplo do trabalho do Professor Maffia”.
Toninho Guerreiro, por sua vez, demonstrou o quanto o título foi marcante também para os veteranos. Dispensado da convocação para a Copa do Mundo de 1970, de maneira até cruel, ele deu a volta por cima sagrando-se tetracampeão estadual de maneira consecutiva e também se tornando artilheiro do Paulistão por três anos seguidos, calando críticos e antigos torcedores do litoral que diziam que ele só sabia fazer gols se fosse Pelé a assisti-lo. 
Já Laudo Natel não continha a felicidade e as lágrimas. A conquista foi o presente que ele sempre quis dar a torcida são-paulina, por ela ter acreditado no sonho dele, no sonho do Morumbi, nos duros anos dessa empreitada. 
“Agora, já posso pendurar as chuteiras e dar meu lugar a dirigentes novos”. Laudo deixaria a presidência do Tricolor no dia 15 de março de 1971, dando lugar a Henri Aidar após sete mandatos e quase 13 anos de administração. A saída do patrono são-paulino, dizia ele mesmo, significaria uma nova era para o Tricolor, uma nova era dourada e banhada em conquistas, frutos da vanguardia que foi imaginar e realizar o Estádio Cícero Pompeu de Toledo.
O Campeonato, porém, ainda não havia sido concluído, de fato. Restava uma rodada. Mas isso não significava que a festa já tinha acabado. Ela só durou um pouco mais e com um convidado novo: o Corinthians. Coube ao rival entregar as faixas de campeão a cada um dos jogadores tricolores no último jogo do Paulistão de 1970.
No dia 13 de setembro, quase 80 mil pessoas (63.373 pagantes e 79.483 presentes, entre menores e convidados – recorde do campeonato) foram ao Estádio Cícero Pompeu de Toledo, a tão sonhada casa são-paulina, recepcionar e saudar cada um dos campeões do Tricolor. E, de quebra, se desse para vencer o rival, ninguém iria reclamar, também.
As fotos presentes nessa obra são referentes a essa passagem, em sua maior parte (exceto as que ilustram os anexos finais).
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