O ano de 1946 foi um capítulo marcante e especial na história do Tricolor. A temporada começou auspiciosamente bem: goleada para cima do Corinthians – 5 a 1 (gols de Rubén Barrios, duas vezes, Remo, Antoninho e Américo), logo no dia 1º de janeiro.
E terminou magnificamente com a conquista do título paulista no dia 10 de novembro – o primeiro da história são-paulina realizado de forma invicta (feito que só veio a se repetir em 2012, com a Copa Sul-Americana, entre as competições de longa duração).
O PAULISTÃO DE 1946
O torneio estadual se iniciou em abril. Na estreia, 4 a 0 sobre o pequeno Jabaquara, de Santos. Antes da segunda rodada, deu tempo ainda de golear o Flamengo, em amistoso no Pacaembu, por 7 a 1: uma partida sensacional de Teixeirinha, que marcou quatro gols (Leônidas deixou dois e Yeso completou o placar).
No estadual, o Tricolor embalou seis sucessos seguidos, culminando em nova vitória sobre o Corinthians, agora por 2 a 1, em junho, antes do primeiro tropeço: o empate em 1 a 1 com a Portuguesa, na sétima rodada. Nos clássicos posteriores: 3 a 2 no Santos, na Vila Belmiro, e 1 a 1 com o Palmeiras.
Após outra ampla sequência de vitórias (sete, que terminou depois derrotar novamente o Corinthians, 2 a 1, em outro empate com a Lusa, 1 a 1), o São Paulo chegou às duas rodadas finais com somente três pontos perdidos, dentre 36 possíveis. O segundo colocado na tabela era o próprio Corinthians, freguês na temporada, que possuía quatro pontos perdidos – as duas únicas derrotas deles foram justamente para o Rolo Compressor.
A segunda vitória sobre o rival, aliás, rendeu aos tricolores um prêmio muito cobiçado: a Taça dos Invictos de A Gazeta Esportiva. A taça fora instituída em 1939 pelo jornal paulistano e seria concedida ao clube que quebrasse o recorde de jogos consecutivos sem perder no Campeonato Paulista (até aquela data: 22 jogos, marca pertencente ao Palestra Itália de 1934). O São Paulo completou 23 jogos invictos, contando com os últimos seis resultados do certame de 1945.
Os festejos pela condecoração foram enormes e paralisaram a capital paulista no dia 5 de outubro. Uma carreata com mais de 600 carros, 30 caminhões, 20 motocicletas e seis carros alegóricos percorreram o trajeto Pacaembu-Canindé* ao som de duas bandas musicais e muitos fogos de artifício.
E o Campeonato nem havia terminado ainda.
Na penúltima rodada, o Tricolor enfrentou o Juventus e goleou por 7 a 0, com direito a espetáculo de Luizinho, que fez quatro gols e um mais bonito que o outro (de pé direito, de cabeça, de falta e de chaleira). Já o Corinthians sofreu, mas venceu o Ypiranga por 3 a 2. A decisão seria mesmo na última rodada e seria a vez do time do Parque São Jorge enfrentar o combalido Juventus.
Por sua vez, o São Paulo bateria de frente com o Palmeiras, rival da conquista de três anos antes, quando a moeda caiu em pé. O jogo dos são-paulinos, todavia, seria uma semana depois da partida corintiana!
Apesar do espetáculo que o então Tricolor do Canindé deu em todo o campeonato, muitos analistas viam o alvinegro como favorito ao título, visto o tradicional nível de dificuldade do Choque-Rei e ao fato do Corinthians ter goleado o Juventus por 5 a 1, obrigando os tricolores a vencerem o clássico (um empate provocaria decisão em jogo extra entre os dois primeiros colocados).
A DECISÃO DO TÍTULO
Entre 40 e 45 mil pessoas no Pacaembu para a decisão do Paulista de 1946. Bola rolando, jogo tenso e amarrado na etapa inicial, com poucas chances para ambos os lados. O primeiro tempo terminou como começou, 0 a 0.
O cenário mudou radicalmente na fase complementar, em que o São Paulo dominou a peleja, fazendo forte pressão. Aos 12 minutos do segundo tempo, o tricolor Luizinho atingiu o goleiro palmeirense em uma dividida. Começou a confusão, com socos e pontapés aqui e acolá. Quando a coisa se acalmou, o árbitro expulsou dois de cada lado: Luizinho e Remo, pelo São Paulo, Og e Villadoniga, pelo Palmeiras.
Mas sobrou também para o argentino e são-paulino Renganeschi, que no rebuliço levou uma pancada e, contundido, foi deslocado para a ponta esquerda para fazer número (não eram permitidas substituições, na época).
Praticamente com um a menos, o fim do jogo foi de muita superação e vontade por parte dos tricolores. Aos 38 minutos, Bauer avançou pela ponta direita e cruzou. A bola subiu estranhamente, enganou o goleiro adversário e bateu no travessão. Então, de onde menos se esperava, veio o sutil toque que rolou a bola mansamente para o fundo do gol. Renganeschi! Manquitolando no ataque, o zagueiro definiu o jogo e o título!
ANO MÁGICO
A temporada do Tricolor foi perfeita. Até hoje, nenhuma outra campanha superou essa em aproveitamento. 84,21% dos pontos disputados (à época, 2 pontos por vitória): 30 vitórias, quatro empates e quatro derrotas. No Campeonato Paulista: 92,5% de aproveitamento e nenhuma derrota. Título invicto!
Gijo, Piolim, Renganeschi, Ruy, Bauer, Noronha, Luizinho, Sastre, Leônidas da Silva, Remo, Teixeirinha, entre outros grandes jogadores, fizeram do São Paulo verdadeiramente o Rolo Compressor dos anos 40.
FICHA DO JOGO
10.11.1946
São Paulo (SP), Estádio Municipal de São Paulo (Pacaembu)
Sociedade Esportiva PALMEIRAS 0 X 1 SÃO PAULO Futebol Clube
SEP: Oberdan, Caieira e Gengo; Og Moreira, Túlio e Valdemar Fiúme; Lula, Lima, Villadoniga, Canhotinho e Mantovani.
Técnico: Ventura Cambon
Expulsões: Og Moreira; Villadoniga
SPFC: Gijo; Piolim e Armando Renganeschi; Ruy, Bauer e Noronha; Luizinho (capitão), Antonio Sastre, Leônidas, Remo e Teixeirinha.
Técnico: Joreca
Gol: Armando Renganeschi
Expulsões: Luizinho; Remo
Árbitro: Bruno Nina
Renda: Cr$ 651.125,00
Público oficial: Desconhecido
CAMPANHA
Fase única – Turno
Fase única – Returno
CLASSIFICAÇÃO FINAL
Time | PG | J | V | E | D | GM | GS | SG | |
1º | São Paulo | 37 | 20 | 17 | 03 | 00 | 62 | 20 | 42 |
2º | Corinthians | 36 | 20 | 18 | 00 | 02 | 62 | 29 | 33 |
3º | Portuguesa | 28 | 20 | 13 | 02 | 05 | 46 | 20 | 26 |
4º | Santos | 22 | 20 | 09 | 04 | 07 | 37 | 32 | 5 |
5º | Palmeiras | 20 | 20 | 08 | 04 | 08 | 37 | 31 | 6 |
6º | Portuguesa Santista | 17 | 20 | 07 | 03 | 10 | 41 | 51 | -10 |
7º | Ypiranga | 14 | 20 | 06 | 02 | 12 | 35 | 48 | -13 |
8º | Comercial (SP) | 14 | 20 | 04 | 06 | 10 | 38 | 55 | -17 |
9º | São Paulo Railway | 12 | 20 | 05 | 02 | 13 | 27 | 46 | -19 |
10º | Juventus | 11 | 20 | 04 | 03 | 13 | 32 | 60 | -28 |
11º | Jabaquara | 09 | 20 | 04 | 01 | 15 | 27 | 52 | -25 |
OS HERÓIS DA CONQUISTA
JOGADOR | P | J | V | E | D | GM | GS |
Teixeirinha | AT | 20 | 17 | 3 | 0 | 13 | 0 |
Noronha | LM | 20 | 17 | 3 | 0 | 0 | 0 |
Gijo | GL | 20 | 17 | 3 | 0 | 0 | 20 |
Renganeschi | DF | 20 | 17 | 3 | 0 | 1 | 0 |
Ruy | LM | 19 | 16 | 3 | 0 | 1 | 0 |
Bauer | LM | 19 | 16 | 3 | 0 | 0 | 0 |
Remo | AT | 17 | 14 | 3 | 0 | 11 | 0 |
Piolim | LM | 16 | 13 | 3 | 0 | 0 | 0 |
Antonio Sastre | AT | 15 | 13 | 2 | 0 | 2 | 0 |
Luizinho | AT | 14 | 11 | 3 | 0 | 10 | 0 |
Leônidas | AT | 14 | 12 | 2 | 0 | 12 | 0 |
Yeso | AT | 9 | 8 | 1 | 0 | 4 | 0 |
Rubén Barrios | AT | 8 | 7 | 1 | 0 | 2 | 0 |
Savério | DF | 4 | 4 | 0 | 0 | 0 | 0 |
Antoninho | AT | 4 | 4 | 0 | 0 | 1 | 0 |
Armando | LM | 1 | 1 | 0 | 0 | 0 | 0 |
*O itinerário da passeata de comemoração dos tricolores foi o seguinte: Estádio do Pacaembu, Av. Pacaembu, Av. Gen. Olímpio da Silveira, Rua das Palmeiras, Rua Sebastião Pereira, Largo do Arouche, Rua Vitória, Av. São João, Rua Libero Badaró, Largo de São Bento, Rua Florêncio de Abreu, Av. Tiradentes, Rua João Teodoro, Rua Canindé, Sede.